Cegueira
Ah, feriado. Um dia perfeito para se enfiar em casa e dormir o dia todo, ir ao shopping ou cinema, passear com amigos e coisas assim. Hoje em dia o feriado não é nada mais, nada menos que um dia de folga, um bônus dos fins de semana.
Por essa razão, minha viagem até o centro da cidade foi completamente inútil. A manhã estava linda, porém, não era o céu ou o sol que me chamava a atenção naquelas ruas importantes, eram as calçadas. Foram poucas as que estavam vazias. A maioria ocupada por moradores de rua, mendigos e afins.
O mais comum ao se ver um desses é sentir dó, pena ou nojo. Entretanto, nenhum desses sentimentos me afligiu essa manhã. Só podia sentir a revolta. Ah, malditos (não os mendigos). Enquanto tantas pessoas estão na rua passando fome, o que os políticos estão fazendo? Enchendo suas cuecas com dinheiro público? Os bolsos? Os ternos? Não? Sim? Não sei. Afinal, a cada dia devem encontrar um lugar mais inusitado para se enfiar o dinheiro... Talvez algum dia descubram sua cavidade anal...
Enfim, estou me desviando... Depois de cumprir meu dever no centro, entrei numa lanchonete e fiz uma pequena refeição. Um pão de queijo, uma coca-cola de garrafa e outra de 600 ml. R$6,50 sem Mastercard. “Facada”, penso. Saio da lanchonete acompanhada de minha prima que bebe alegremente a coca-cola de 600 ml. Caminhamos uma quadra até a faixa de pedestres. Ao atravessá-la, um garoto de não mais que 16 anos para ao nosso lado e diz:
-Dá um gole?
Assumo, minha primeira ideia foi que ele iria nos roubar se não déssemos a garrafa.
-O que você acha? – Minha prima pergunta.
-Você que sabe. – Respondo, caindo na real.
Olho novamente o garoto. Ele não era um visitante do centro. Ele era outro dos moradores de rua, com certeza. Ele nos olha suplicante e minha prima entrega a garrafa que continha metade do líquido. Já tínhamos matado a sede e íamos continuar andando quando o garoto disse:
-Pode levar?
-Claro. – Minha prima responde.
Continuamos caminhando em direção ao ponto de ônibus.
Não quero deixar isso como um exemplo afinal, no primeiro momento nem pensei em como devia ser a vida daquele garoto. Mas, quero mostrar o quão presos estamos. Não vemos mais um morador de rua. Somos todos cegos ao sofrimento alheio. Se um ator famoso passa 2 horas sem comer, alguém diz: “Coitado, deve ter passado tanta fome!”. Porém, quando passamos na frente de um mendigo suplicando nossa ajuda, nos contentamos a virar o rosto e fingir que não é conosco.
Sei que muitos desses moradores de rua vivem assim por escolha própria. Porém, tantos outros não puderam escolher entre ter uma casa e viver na imundice do centro de São Paulo. Como disse antes: Um pão de queijo, uma coca de garrafa e uma coca 600 ml, R$6,50. Fazer algo que não lhe dá arrependimento por saber que é a coisa certa, não tem preço!