E a Morte?
1. Hoje amanheci com vontade de escrever alguma coisa sobre a Morte. Também, na véspera de Finados o assunto não poderia ser outro. Esqueçamos, por enquanto, os vivos e vivamos, intensamente, a saudade dos nossos mortos.
2. Quando procurava esquecer os vivos, veio-me à lembrança um poema que li não me "arlembro" onde, e que, a certa altura, disse o poeta:
"Ah! Aqueles que já partiram! / Aqueles que viveram entre nós. / Que encheram de sorrisos e de paz a nossa vida. / Foram para o além deixando este vazio inconsolável. / Que a gente, às vezes, disfarça para esquecer. / Deles guardamos até os mais simples gestos. / Sentimos, / quando mergulhados em oração, / o ruído de seus passos e o som de suas vozes."
3. Enquanto pensava como falar sobre a Morte, sem cair naquela de derramar lágrimas ou de fazer alguém chorar, tanatófobo que sou, me fiz, talvez pela enésima vez, esta pergunta: afinal, por que Francisco de Assis chamou a morte de irmã?
4. Disse o Poverello: "Louvado sejas, meu Senhor,/ pela nossa irmã, a morte corporal, / da qual ninguém pode escapar." Esses versos do Cântico do Irmão Sol sempre me levam à mais profunda reflexão, como muitas indagações; até para afastar de mim o pavor que de mim se apodera quando me lembro que, um dia, terei que partir, para uma viagem sem volta...
5. O Dia de Finados é uma invenção cristã. Lendo sobre suas origens, fiquei sabendo que no Século I os cristãos faziam demoradas orações pelos falecidos. A partir do Século V, a Igreja Católica estabeleceu que um dia do ano deveria ser dedicado aos mortos. No Século XIII, ficou determinado que os falecidos seriam lembrados no dia 2 de novembro.
6. É bom não esquecer, que o Dia de Finados não é, desde sua instituição, o dia somente dos nossos mortos. Não. No Dia de Finados são lembrados todos os mortos; além dos nossos, os mortos desconhecidos e os esquecidos. No Dia de Finado visite-se os ricos mausoleus e as covas rasas, onde um nome numa tosca cruz é a identificação do falecido.
7. Sobre a Morte, existem inúmeras e espantosas estórias, estranhas crendices e muitas superstições . Algumas superstições povoaram minha infância. Hoje, um provécto cidadão, ainda acredito em muitas delas.
8. Sem querer provocar pânico, gostaria de relembrar algumas que o povo acredita e respeita:
- Quando morre uma pessoa, deve-se abrir todas as portas da casa para a alma sair correndo. Fecham-se somente as portas trazeiras: a alma deve sair pela frente.
- Não se deve trazer terra do cemitério quando se volta de um enterro, pois ela traz a morte para casa. - Água benta ou alcânfora temperada na pinga joga-se com um galho de alecrim sobre o defunto. Vi isso em um velório no interior do Ceará. Os vivos presente, aproveitaram e caíam na cachaça!
- Não se deve chorar a morte de um anjinho: as lágrimas molharão suas asas, impedindo-o de chegar ao céu.
9. Uma superstição me acompanha, através dos anos. Herança de minha mãe. Ela entrava em pânico quando a procissão da padroeira passava pela nossa rua. Acreditava que se o andor da santa parasse na porta de casa, alguém da família morreria naquele ano. Lembro-me dela chorando de alegria quando o andor da padroeira passava direto.
10. A Morte é traiçoeira; não avisa a chegada. Mas, como disse São Francisco de Assis, dela "ninguém escapa". Paciência!
11. Meus caros leitores, celebrem o Dia de Finados contritos e, de preferência, em silêncio. Os mortos não gostam de algazarra. Respeitem os cemitérios. Eles são os dormitórios dos mortos. Ao pé de cada túmulo, lembrem-se que "O Dia de Finados é o dia do Amor, porque amar é sentir que o outro não morrerá nunca." Dificil não ter medo da Morte. Que São Francisco me perdoe!
Nota - Na foto, o corpo (intacto!) de João XXIII, que colhi, na minha recente visita ao Vaticano. Publico-a, homengaeando os mortos.