PASARGADA, BANDEIRA E EU

Por Carlos Sena


Não vou embora pra Pasárgada, pois não sou amigo de nenhum rei. Tampouco não quero nenhuma pedra no meio do meu caminho, porque sozinho caminhando assumirei todas as quedas. E todas as pedras saberão do meu tombo, se houver claudicação. E não adianta me dizerem que muitos são os chamados e poucos os escolhidos, porque na minha direção de vida, nunca pude escolher meus dissabores - eles sempre me surpreenderam e eu carreguei alguns a tiracolo e outros destrocei nos espaços entre ego e superego. Escolhi, nos meus viveres distintos, coisas certas e erradas. Com as certas consertei meus tormentos interiores até que outros surgiram e eu sigo me refazendo em novas tentativas. Coma as erradas me joguei no espelho das evidências e pedi clemência a Deus, enquanto o tempo de cada coisa não se completasse.
Não vou embora pra Pasárgada. Decidi que não vou, mas não quero ficar neste lugar invadido pelos meus desatinos ensimesmados de reverberação. Quero um lugar de silêncio consentido, conquistado entre idas e vindas, subidas e descidas, choro e lágrimas, tapas e beijos. Lá nesse lugar imaginário vou fincar meus anseios de eternidade, desafiando o universo para a proeza de me ter em si, de ser em mim absoluto e relativo, enquanto as linhas retas dos meu desejos não se percam no infinito.
Mesmo sabendo que há mais coisas entre o céu e a terra do que nossa vã filosofia possa imaginar, quero o que quero: estou na idade do meu querer, do meu fazer, do meu ser. Posso não ser hoje, mas amanhã o serei em sua plenitude ou em parte, porque os mistérios da vida podem estar entre o céu e a terra, encerrando a fantástica aventura do equilibrista em cima do muro.
A parada do silêncio não cala os sonhos do amor refeito. Cacos de mim foram recolhidos na calçada cheia de ontens, enquanto as flores do mato enclausuram lágrimas por vezes derramadas num simples gesto de adeus. Seguirei. No caminho percorrido não deixarei marcas para o caso de arrependimento - por que arrependimento? Eu determino o que quero e posso querer até o que nem programei? Hei de seguir minhas pegadas. Além do horizonte pode haver "shangrilá", mas além de mim uma oração contrita me transportará incólume por entre as estrelas. Constelações de sucessos e fracassos exaustivamente ingeridos sob forma de festa ou de depuração espiritual.
Pégasos, águias: alados irão descortinar o universo! Quero me esvoaçar no espaço dos meus aconteceres e neles ser a noite e ser o dia, ser a virgem e ser Maria; ser o sol e ser o sal, ser o bem e ser o mal. Ser a vida parida, ser da boca a mordida. Do desejo, ser o beijo; e do afago o desespero até o encontro do "morro" de Vênus...
Não vou embora pra Pasárgada! Lá não há rei, Manuel, esta é a minha Bandeira.

Carlos Sena - csena51@hotmail.com