JOGOS DE SAUDADE

O telefone tocou. Era o meu neto Igor, de dez anos, pedindo-me ajuda para um trabalho escolar.

Queria saber de jogos infantis do meu tempo de criança, os quais não mais seriam praticados nos dias de hoje, neste mundo de Deus quase todo dominado pelos videogames e computadores.

Vieram-me à cabeça, logo de cara, os velhos jogos de “Finca” e “Bentialtas”, praticados com alegria pelos garotos do meu tempo. Acredito não mais sejam jogados pela gurizada atual.

Dito e feito, relembro com saudades as disputas que fazíamos, ora jogando “Finca” (mormente na época das chuvas, quando a terra úmida favorecia a cravação da “Finca” no solo), ora jogando “Bentialtas”.

Modéstia à parte, eu era bom nos dois, principalmente no “Bentialtas”.

Ocorre-me a lembrança de um fato engraçado, que gostaria de relatar nesta crônica nostálgica, dirigida aos meus contemporâneos.

De tarde, após o banho, troquei de roupa já exibindo calças compridas (até então só vestia calças curtas), estreando o meu ingresso no clube dos rapazinhos, faixa de doze, treze anos. Estava cheio de orgulho juvenil, vaidoso como um pavão.

Cabelo empastado de brilhantina “Glostora”, topete bem feito, caprichado, lá vinha eu caminhando com elegância pela calçada da Rua Horta Barbosa, rumo à padaria, comprar o pão pro café vespertino.

Um pouco adiante, duas duplas de garotos, amigos meus, jogavam “Bentialtas” com suas casinhas simples, de gravetos, armadas no passeio da Fábrica de Tecidos Renascença.

Fui-me aproximando, quando um deles arremessou a bola de meia com força, procurando acertar a casinha do adversário. Mas eu estava no meio do caminho e a bola atingiu-me o peito, deixando sua marca redonda de terra na camisa branquinha que eu acabara de vestir.

Furioso, corri para a dupla (que fugiu) e, chegando à casinha de gravetos, meti o pé direito com vontade (bastaria um leve toque para desarmá-la, pois era apenas um triângulo armado com três pauzinhos), despejando no brinquedo inocente toda a minha raiva de adolescente contrariado.

Com a força do chute desproposital, minha perna direita subiu muito e meu corpo foi junto!... Em segundos, desabei de costas, estatelando-me na calçada, para a ruidosa alegria dos meninos que assistiam à cena. Alguns até rolaram no chão de tanto rir... Também pudera, foi cômico demais.

Envergonhado, retornei cabisbaixo à minha casa para nova troca de roupa (calças curtas, agora), adiando assim a estreia da garbosa roupa nova , credencial do meu rito de passagem da puberdade para a adolescência ...

-o-o-o-o-o-

B.Hte., 30/10/03

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 29/10/2009
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