Juventude! (vista por uma jovem)

Li muitos textos falando sobre a juventude. Gosto de lê-los, gosto de ver a opinião de gente mais experiente; concordo com a maioria, mas se eu não fosse jovem e não convivesse com jovens, acreditaria que a juventude é uma maravilha condenada: uma grande força transformadora que está perdida.

É verdade, a juventude está se perdendo para as obrigações: obrigação do consumismo, da luxúria, da rebeldia, do pecado, do "meter os pés pelas mãos". Obrigações impostas de maneira camuflada, apelidadas de "ímpeto da juventude"; outras vezes explícitas, sedutoras, violentas e violentadoras.

Às vezes acho que essa "depravação da juventude" é resultado da falta de orientação; "orientar" que digo não é ditar regras, e sim ajudar a encontrar um Norte. Um problema é que confunde-se "dar espaço" com "largar no meio do deserto com tempestade de areia" (quer espaço mais exclusivo que esse?). É tanta informação sem orientação que não sabemos no que acreditar, por onde começar.

Exageros à parte, aos 20 e poucos anos, que aqui vou representar por "2_", se sente uma grande pressão: "larga mão de ser criança e age como adulto!" Mas não é fácil sair do universo colorido da infância e cair na realidade adulta. É uma transição violenta, e não precisa ser jovem para se sentir "fora dos eixos" quando a vida dá uma guinada.

Como disse, já li muitos textos falando sobre a juventude, mas nenhum sério escrito por um jovem. Talvez por falta de procurar mesmo. De qualquer forma, resolvi dar minha contribuição.

Nós, jovens, dificilmente ouvimos os mais velhos. Por não entendê-los, mesmo. Ou por não querer entendê-los. Na busca por mim mesma, não adianta opinião de ninguém se eu não souber me encontrar. Então não acho que esforços vindos de fora serão alguma vez facilmente aceitos. Mas não vejo problema em tentar.

Eu diria que hoje em dia vemos uma infância mais "feliz". Não quero entrar no mérito se é uma felicidade verdadeira ou aparente, o que eu quero dizer é que cada vez menos se passa por privações: "meus pais nasceram pobres, venceram na vida, hoje não são ricos mas vivem bem; eu, por minha vez, posso ter tudo o que quero sem esforço". Cada vez menos se tem a necessidade de amadurecer logo para assumir as responsabilidades da casa. E, sinceramente, acho isso bom: não é ótimo que as crianças possam ser crianças?

Claro que isso teoricamente. Não quero nem comentar certos absurdos, de filhos mimados e deturpados. Numa era em que não falta informação falta tanto bom senso...

Por que essa impressão de que a juventude está perdida? Jovens depravados, drogados, lascivos sempre existiram, não é de agora. Dizem que isso está ficando pior; eu não sei, porque eu não sei como era a juventude de 10, 20 anos atrás pra poder comparar. O que eu posso dizer é: cada vez passando por menos privações, menos dores, mais aumenta o medo do sofrimento. Como disse acima, temos uma infância mais "feliz", sem dores, e o repúdio do sofrimento se incrementa, porque ela se torna uma desconhecida.

Eu sou considerada "fora do padrão". E conheço muitos jovens "fora do padrão". Conscientes, apaixonados pela vida e pelas pessoas, de idéias maduras, batalhadores, com seus defeitos e dispostos a melhorá-los. Todos eles possuem pelo menos uma, normalmente as duas, dessas características em suas vidas: DOR CONSTANTE e FÉ VERDADEIRA.

Eu acredito que a dor é uma mestre implacável: ninguém passa por ela sem aprender alguma coisa. Eu não prego que o sofrimento é um mal necessário, mas quem já sofreu de verdade fica melhor preparado para os "reveses" da vida. Essa dor pode ser a perda de alguém muito estimado, uma decepção de roubar o ânimo, a urgência em crescer pra tomar conta da família... Aqueles que já sofreram não adquiriram gosto pela dor, porém ela não se apresenta mais como uma novidade.

A juventude é um mistério para quem passa por essa fase. O medo do desconhecido é natural; quando esse desconhecido é algo que sabemos que VAI causar dor, o medo vira pânico. A tendência natural é buscar um refúgio, um lugar seguro e confortável. E aí que entra a diferença da outra característica que citei acima: quem tem sua fé bem fundamentada, encontra nela seu refúgio. A crença em Deus não livra do sofrimento, mas pessoas que carregam uma fé verdadeira encontram em seu Deus forças para enfrentar as dificuldades sem se abater.

Creio que essa minha visão seja bastante simplista. Talvez nem todos que chegam aos 2_ possuem uma dessas duas características citadas, e nem por isso se tornam jovens desvirtuados. Não posso afirmar, pois nunca encontrei alguém assim, mas acredito que isso seja possível. Pois existe uma terceira característica, que é: NÃO TER MEDO DE ENFRENTAR A DOR, encará-la como parte de um processo natural.

Essa pra mim é a fundamental; as outras duas características citadas são "somente" um meio efetivo de se chegar à terceira: quem já sobreviveu a um sofrimento não pode ter medo de enfrentá-lo, e quem tem sua fé firme não se abala diante dos revezes. Contudo, não são os únicos meios de se encontrar coragem para enfrentar as dificuldades, são?

O medo de enfrentar a dor nos leva a buscar um "atalho" pro fim do sofrimento, sem querer encará-lo de frente. É aí que entram os problemas da juventude: a busca inconseqüente pelo prazer, como uma forma de compensar seu sofrimento. "Sexo, drogas & Rock'n'Roll" não é um lema tão recente, não?

Além disso, circula um pensamento de que devemos "viver intensamente a juventude... experimentar de tudo, pois é a época certa de se errar". Concordo. É tempo de descobrir-se, a si mesmo e a seus limites, seus sonhos, valores e virtudes, não se intimidar mas sem ser irracional. É saber ouvir a própria vida, os próprios medos e desejos, a voz da experiência, conselhos dos mais velhos; é pensar com a própria cabeça, entender que está se modelando, passível a erros, mas não fazer deles uma lei.

Contudo, essa não é a interpretação generalizada. A frase dá a impressão de que, se eu não aproveitar agora, amanhã será tarde demais. É uma pressão psicológica, não posso nem parar pra pensar, porque pensar é perder tempo, e se a juventude acabar eu vou ser uma idiota que não aproveitou a vida, não-posso-parar não-posso-pensar eu-tenho-é-que-agir!!! ...E assim eu meto os pés pelas mãos, na pressa de viver acabo me condenando.

E metendo os pés pelas mãos dou de cara com a realidade ainda mais severa: as conseqüências dos meus atos, responsabilidades que não pedi e não quero assumir. O que posso fazer para suportar?

Eu, particularmente, encontro meu refúgio em Deus, minha família e em meu espírito, os três formando uma unidade. Estou acostumada a pensar muito e a suportar muito, desde pequena, e é o caminho que eu sempre segui. Mas pra quem está perdido na tempestade de areia, e nunca procurou um abrigo antes? Onde pode se refugiar?

Álcool. Anti-depressivos. Cigarros. Inalantes. Estimulantes. Tranquilizantes. São tantos "atalhos de fuga", prometem levar embora dessa realidade dura e mostrar um paraíso. E realmente o fazem - ao menos enquanto durar o efeito da droga. O que é difícil de entender é que esse "atalho" te traz de volta ao ponto de partida, ou seja, não é bem um atalho, é apenas um passeio... "Mas, que importa? Só quero fugir dessa realidade, dessa dor... ainda que seja uma ilusão", é o que passa na mente de um viciado. Quer dizer, isso foi o que ouvi que se passa na cabeça de um viciado, não posso falar de verdade porque nunca passei por isso.

Um caminho alternativo que se apresenta, num momento desesperado: a fuga definitiva, o fim de tudo, o caminho sem volta: a Morte. Se não natural, provocada. A vontade não é bem de morrer: é apenas um dos atalhos oferecidos, talvez o que promete menos dor, que promete o fim do sofrimento. Realmente, acaba o sofrimento. E junto dele, a vida, as oportunidades, a juventude.

Conheci alguns colegas que vieram a se suicidar depois. Quem os conhecia afirma que não tinham nada que reclamar da vida, o motivo de tal ato desesperado é um mistério.

Mistério. Mesmo para nós, jovens. O que diferencia um colega suicida de mim? Não sei. Poderia ter sido eu. E se der uma louca em mim e eu me matar num impulso, sem real intenção? Será que foi isso que aconteceu com eles?

Prefiro não pensar. Isso me dá medo. Um medo a mais a ter que lidar. Já não bastam as pressões que eu me imponho e as que o mundo me impõe?

Prefiro não entender.

E nem falo sobre a passividade política e ideológica, que afeta não apenas os jovens mas as pessoas em geral. Ou a prepotência e pseudo-auto-suficiência, que são coisas que começam na adolescência. Talvez fale dessas coisas em um futuro texto. O que quis falar aqui é mais relacionado aos jovens; embora seja sutil, existe uma diferença entre adolescência e juventude, que ao meu ver: adolescente ainda vive na casa dos pais e é tratado mais como criança. Isso leva a motivações diferentes dos jovens, e mesmo que os problemas pareçam ser iguais, acredito que a raiz é diversa.

Enfim, creio que muita gente concorde e discorde do meu texto (e agradeço se deixarem comentários), afinal o que eu escrevo não é uma verdade absoluta. É só uma parte de um todo, uma porção que minha limitação é capaz de enxergar. Aliás, isso é apenas uma parte do que enxergo; muitas coisas em que eu acredito alguém já escreveu sobre o assunto, de forma melhor do que eu poderia expressar; essas linhas representam uma parte que nunca li em parte nenhuma e por isso resolvi escrever, misturando experiências com minhas observações que faço dos outros.

Voo do Corvo
Enviado por Voo do Corvo em 28/10/2009
Reeditado em 28/10/2009
Código do texto: T1891468
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