Helena e o elevador
Profético. Toda a manhã topava com Helena no elevador. Beleza de tirar o fôlego. Mal colocava o pé na rua e já retornava esperando a porta do elevador abrir com o coração aos pulos. A voz parecia sentar-se a beira da sua cama, tão simples e macia:
- Sobe? Ah! É o senhor Vasconcelos?
Recorria ao “como vai?” de ocasião, respeitoso, enfiado em silêncio prático.
Fascinado traçou um plano e viu no ar do final de tarde daquele dia o que seria um perfeito atrevimento. Dormiria com ela. Retornou do supermercado carregando uísque, queijos e até flores. Helena olhou tudo com grande interesse. Interesse de ascensorista. No apartamento observou a garrafa de uísque, o queijo e as flores compreendendo sua vida confinada num espaço muito reduzido. As compras mal cabiam no recinto. Precisava deixar a alma na porta antes de entrar. Alarmado procurou calcular quanto tempo estava vivendo nessa reclusão, até descobrir que não lembrava mais onde ficava o sol nascente... Não constam nas placas de trânsito, por isso estava se sentindo só e sem leste. Cambaleou até o quarto, cada vez menor, e antes que fosse inútil entrar viu que mal cabiam nele os sonhos. Teria que deixar de lado os sonhos para dormir em espaço tão exíguo.
Logo deslizou para dentro de Helena. Fuga profética por onde escapava ileso. Afinal ambos estavam acuados entre paredes protetoras, todavia de espartano egoísmo. Sangrando o corte das linhas precisas que emaranhavam sem escolhas. Estava vivendo entre construções elevadas e dispostas ao eco indiscreto das vozes. Todos corriam por ruas apertadas. Por fim assentiu com a cabeça de que tudo aquilo precisava se abrir, não repetidas vezes, sem libertação de Helena no elevador.