Cotidiano: uma partida de futebol
Sábado, não tenho que acordar cedo, não tem aula, matéria, encheção de saco, bolinhas de papel, dor nos dedos, muita coisa para copiar. Mesmo assim acordo cedo com muito prazer. 8hs da manhã tocou o despertador, lavei o rosto, liguei pata um amigo, tudo confirmado, vibrei de alegria. Liguei o rádio, queria relaxar, estava muito tenso. Lanchei com meus pais, café reforçado, o esforço seria grande. Preparei minha mochila, eram 8:40hs, faltava pouco para sair de casa, era um belo dia, ensolarado, lindas flores, estávamos na primavera, linda estação, ela sempre me inspirou. 8:50hs, pego minha chuteira, beijo os dois pés, pego minha camisa, número 10, linda, azul, detalhes em branco, beijo ela também. Saio de casa. Sou o craque do time. Era dia de uma partida de futebol.
9:10hs, toco a campainha, casa do meu amigo, bela fachada, pedras rústicas, lindo quintal, bem cuidado. Ele atende, sai de casa, fecha a porta, me cumprimenta, é o goleiro do time, costuma fazer belas defesas. 9:20hs, chegamos no campinho, o time adversário já estava se aprontando, fazem cara feia, rangem os dentes. O meu time ainda não tinha chegado, fui no vestiário, prendi o cabelo, troquei a camisa, a meia, coloquei a chuteira, me benzi. 9:35hs, o resto do time chega, atrasados, o que não é novidade, são preguiçosos, dormem até mais tarde, estão alegres, a vitória em questão de tempo, não penso assim, não mesmo, o outro time é bom, vi eles jogarem, bateram o adversário, goleada, deu até dó, o outro time era fraco, o pior, a cidade inteira sabe. 9:50hs, falta pouco, a torcida animada, gritando muito, eles chegaram. Tinha algumas meninas do bairro, algumas lindas, desejadas, incentivo, tenho que jogar bem, impressionar, elas gostam disso, aquelas sapequinhas.
10hs em ponto, seu João apita o início do jogo, é um aposentado, era advogado, muito honesto, barba branca, querido por todos, nunca roubou no jogo, seus netos jogam, pernas de pau. Dei o pontapé inicial, controle de bola, primeira falta, cobro, passa perto. Domino a bola, tabelo, saio na cara do gol, torcida inflamada, as meninas histéricas, decepção, chutei em cima do goleiro, ele estava bem colocado, chutei fraquinho também. O time deles ataca, nosso goleiro encaixa, bem seguro, levamos o primeiro susto. Bola pra lá, bola pra cá, cruzamento, cabeçada, trave, pego o rebote, chuto, o goleiro espalma, escanteio. Mal cobrado, a zaga afasta, contra-ataque, apreensão na nossa torcida, ataque perigoso, passou perto, susto, lamentações, o atacante fica desolado, perdera um gol feito. O jogo começa a ficar truncado, muita marcação, pouco jogo, torcida começa a chiar, ninguém gosta de jogo sonolento. Bocejos, vaias, alguns vão embora, torcida gosta de jogo bonito. Nosso treinador berra, nosso time tem treinador, é organizado, mas é amador. Fim do primeiro tempo.
Intervalo, hora de matar a sede, instruções, táticas doidas, pode dar certo, se Deus quiser. Precisamos da vitória. Juiz chama, começa o segundo tempo.
Nosso time começa bem disposto, tocando muito a bola, carrinhos, dribles, belas jogadas, a vitória é uma questão de tempo. Noto uma menina, sentada, linda, linda, espetacular, estava torcendo para o meu time, que emoção, acabei desconcentrando, fritos, falavam comigo, não via nada, só ela, que beleza, que mulher! Me cutucam, a nuvem se esvai, volto ao jogo, recebo a bola, driblo um, driblo o segundo, estou empolgado, quero impressiona-la, embaixo da perna do terceiro, estou frente a frente com o goleiro, ele cai, toco por cima, jogada linda, penalty! Ele puxou a minha perna. Batidas fortes do coração, suor, coceira, cansaço, vou bater o penalty, ela confia em mim, é a grande chance, falam no meu ouvido “bate no canto direito”, corro, sou teimoso, olho para ela, me desconcentro, bato no canto esquerdo, defesa, mais lamentações, decepcionei a menina, o jogo perdeu a importância, perdeu a graça, acabou 0 x 0.
Cumprimentos, beber água, lamentar o penalty perdido, ela se foi, toda a torcida também. Ressalvas, elogios, broncas, tudo ao mesmo tempo. Volto para casa, meu amigo me acompanha, me dá força, chega a sua casa, se despede, é hora do almoço. Chego em casa, tomo banho, almoço, descanso, vejo um pouco de TV para relaxar. Não esqueço dela, nem da chance perdida, tento pensar: “é normal”, Zico já perdeu penalty, Pelé também. Saio de casa, hora de curtir, sábado acho que foi feito para isso. Estou sozinho, festa na praça, encontro amigos, conversa vai, conversa vem, política, economia, futebol, o jogo, o fatídico penalty perdido, sempre me lembro disso, maldita lembrança.
Bebidas, música alta, azaração, juventude, hormônios exaltados, discussões, foras, alegria. Algo me chama a atenção, é ela, mais linda que na hora do jogo. Vou até ela, converso, tento me explicar, não se importa, me elogia, parece gostar de mim. Pergunto seu nome, Joana, belo nome, saímos juntos da festa, tema para quem sabe uma próxima história.