Trincheiras...
Águida Hettwer
 
 
 N
o pátio da minha infância, a televisão era em preto e branco, exceto quando se usava uma película colorida para desmistificar o cinza da ilusão. Até parece que foi ontem, brincava de esconde-esconde, e “Letz” era tanta diversão nas margens da simplicidade.
 
 
 Deixar os sapatos do lado de fora. Pedir bênçãos ao despertar, licença em se retirar, era pura educação. Lembro-me da primeira vez que fui ao cinema com a turma da escola Cristo Rei, ver “Marcelino pão e vinho”, e na atualidade quando assisti “Olga” obviamente que algum cisco acertou em cheio meus olhos.
 
 
 Todavia na adolescência, minha timidez fazia-me atravessar a rua sem sair de casa. Ainda hoje o pensamento lavra as plantações de trigais. Apanha frutas maduras no quintal, colhe expressões angelicais de pessoas, guardadas no recôndito da memória.
 
 
 Mesmo que o tempo cavalgue, não cedo as minhas convicções e verdades. Continuo lendo o jornal de trás para frente, tenho o silêncio como fiel amigo. Não enterro lembranças e nem risco nomes de listas. Percebo a maestria da vida, quando julgamo-nos fortes nas nossas limitações.
 
 
 Na vida não há receituário para seguir a risca. Fazer releitura do que se passou, apenas para colocar pontos e vírgulas. Permitindo reticências para novas histórias. Nas trincheiras abertas germinam flores, mesmo que estas também contêm espinhos.
 
 
 
22.10.2009