Prosaicas academias

O tema é polêmico e requer muita habilidade pessoal, para não ferir susceptibilidades. De uns tempos para cá, venho querendo falar dele, mas confesso ficar com receio do patrulhamento ideológico das feministas de plantão, que não pensarão duas vezes para rotular-me de machista. Dirão até que pretendo acabar com a maciota delas, o que não é verdade...

Por isso, ando com um pé atrás – e só não ando com os dois porque me desequilibro e caio – com relação a temas passíveis de ser alvo de controvérsias. O fato é que a população mundial anda com excesso de peso, certamente por consequência dos progressos conquistados em vários setores, que nos deixam cada vez mais ociosos, substituídos que fomos pelas máquinas, nos serviços sujos, pesados ou perigosos. Com efeito, a obesidade grassa nos países desenvolvidos e já ameaça até o Brasil.

Espalham-se por todo canto, também, as academias e spas, que faturam alto nesse nicho rentável que é o do emagrecimento, numa era de culto à beleza escultural.

Queria apenas dizer que, até pouco tempo atrás, as mulheres não precisavam de academias para ficar em forma. Nem os homens...

Não que a alimentação fosse mais saudável e que as pessoas comessem menos. Ao contrário, havia até o medo de ficar muito magro, que era sintoma de doença grave. Principalmente da tuberculose. Por isso, comia-se muito.

O trabalho, naquela ditosa era, requeria sempre muita força bruta. Queima de calorias, enfim. O homem fazia uso intensivo dos seus braços e pernas não só no trabalho, mas para se locomover, porque poucos tinham carro.

Nas casas, o trabalho doméstico, geralmente feito pelas mulheres, as deixava sempre naturalmente bem torneadas. Pela manhã, carregavam lenha para alimentar o fogão. Gastavam um fôlego danado para acender e manter o fogo crepitando. Utilizam o pilão para descascar o arroz, socando até o suor brotar por todo o corpo, molhando as vestes. Operavam com destreza a máquina de moer carne, no muque. Também na força física bruta era a retirada d’água das cisternas, girando pesados sarilhos. Corriam atrás do frango para pegá-lo e sangrá-lo. Gastavam energia o depenando. Melhoravam a acuidade visual catando pedras no feijão, e piolhos na cabeça dos meninos.

Almoço feito, as donas-de-casa carregavam panelas fumegantes para as mesas. Lavavam vasilhas sem as facilidades dos detergentes modernos e das lava-louças automáticas. Era tudo na base da areia com bucha vegetal, esfregando com sofreguidão até sair o sujo do carvão nos fundos das panelas. Só a lavagem de roupas era feita por profissionais do ramo, que se utilizavam de sabão artesanal, feito de sebo bovino e cinza coada de fogão a lenha (que contém potassa). Eficaz, mas fedorento.

Para limpar os picumãs e teias de aranha no telhado, as mulheres vasculhavam os tetos das casas, com vassouras especiais de cabo longo e pesado. Enceravam o cimento queimado do piso de forma manual e o faziam brilhar com pesados escovões de ferro fundido, num vaivém enérgico. As enceradeiras só existiam em algumas cidades com luz elétricas e em poucas e abastadas residências...

Para o banho, havia uma ritualística nada motivadora. Tinha-se que pegar água no tanque – ou na cisterna, novamente -, colocá-la em grande caldeirão no fogão a lenha, aquecer a água, levá-la quente para o banheiro. Nesse ambiente sempre muito escuro, contíguo à onomatopéica privada “tum”, havia um balde adaptado para chuveiro. Ele era preso a uma corda e içado até determinada altura, por meio de roldana amarrada na cumeeira.

Como se vê, tudo requeria força. Nada era fácil. Tudo queimava caloria. Assim, para que academia? Para que cirurgia plástica?

Recentemente, vi na televisão uma engenhoca feita por um cidadão da zona rural, que me fez lembrar as dificuldades de antigamente. Ele acoplou uma bicicleta a um dínamo e este a uma bateria. Enquanto pedalava a bicicleta sobre cavaletes, mantinha a forma física e gerava energia para carregar uma bateria. Com a energia acumulada, podia-se assistir às novelas televisivas.

Soube também de certa “bicilavadora”, que vem sendo desenvolvida por um instituto de pesquisas. Alimentada por força humana, é como se fosse uma bicicleta acoplada à máquina de lavar roupas. Como as cidades estão cada dia mais violentas, será uma maneira genial de manter a forma física, pedalando com segurança e lavando toda a roupa da casa, sem gastar um centavo sequer com energia elétrica.

Se a moda pega, esses novos inventos podem revolucionar nosso dia-a-dia. Como são engenhos ecologicamente corretos, as mulheres deverão aprová-los, mas com uma ressalva: quem vai pedalar as geringonças são os homens...

Autor: Itamaury Teles

Itamaury Teles
Enviado por Itamaury Teles em 18/10/2009
Código do texto: T1873189
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