PEGA LADRÃO

Praça da República, coração de São Paulo, domingo bonito, sol claro e gostoso, o local coalhado de gente, meus dois filhotes brincando e dando comidinha aos pombos.

As graciosas aves chegavam próximo aos guris, a princípio tímidas e nervosas, o pescocinho trêmulo, de cores rútilas, as asas tesas, sempre prontas a alçar vôo para o caso de um ataque inesperado das crianças (e de muito adulto besta também ...), bicavam o amendoim que lhes era oferecido pelos meninos, afastavam-se, retornavam com gula maior e, sentindo a sinceridade dos garotos no gesto alegre e espontâneo, chegavam mais perto ainda e comiam à vontade.

A criançada ria feliz vendo as pequenas aves comendo em suas mãozinhas inocentes. Eu os acompanhava de perto, um sorriso largo emoldurando-me o rosto moreno, mais feliz ainda do que eles.

Súbito passa um rapazote correndo por entre as pessoas muitas que se achavam na praça, serpenteando acrobáticamente em meio aos quadros exibidos por pintores primitivos, às bancas de moedas antigas (numismática), ao artesanato de madeira, às coleções de selos (filatelistas), perseguido de longe por u’a meia dúzia de homens e mulheres, todos gritando em uníssono o terrível “- Pega ladrão ...” ! ...

Quase na extremidade da praça, já prestes a ganhar a Avenida Ipiranga, onde certamente fugiria do alcance de todos, misturando-se ao povaréu que transitava àquela hora do dia, o rapazote foi barrado por um guarda.

Imediatamente, e mostrando ser dono duma presença de espírito enorme, sutil e atrevida, o moço apontou para a frente e gritou ao militar que tentava segurá-lo:-

“- Ali, seu guarda! Pega ladrão! ...”

O policial, atrapalhado, largou o braço do moço, o verdadeiro gatuno, correndo aflito na direção indicada, enquanto este se afastava rápido pelo lado oposto, fugindo de vez à perseguição que lhe era movida e à perspectiva de passar alguns dias no xilindró.

Sorrindo gostosamente, tomei as mãos dos meus filhos, apanhei um táxi e rumei para casa, elaborando já de cabeça a minha próxima crônica .

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São Paulo, 04/03/69

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 18/10/2009
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