CRÔNICA DE SETEMBRO
Eu poderia começar dizendo que setembro foi um mês de perdas, dor, sofrimento, lágrimas e luto, ou, que foi um setembro com cara de agosto (mês do desgosto, segundo as crenças populares), não estaria mentindo.
Mas, prefiro pensar que foi um mês atípico. Uma primavera onde os botões murcharam antes de desabrochar. Onde as cores brilharam menos e os beija-flores voaram no jardim da eternidade. Foi um mês de muita chuva, mas ela não caía do céu, não era lá que as nuvens se formavam. As nuvens e a chuva estavam em mim. Em meu coração.
O orvalho que amanhecia em meu olhar ficava ali o dia inteiro. As nuvens de tristeza que passeavam no céu de minha dor impediam o sol de brilhar dentro de mim. Fez inverno em setembro, mas não senti frio, apenas apatia.
Setembro foi, também, um mês de aprendizado. Aprendi que perder pode ser uma forma de ganhar, que uma coisa não elimina a outra. Perdi pessoas que levarei sempre comigo, na lembrança, na saudade, no desejo de ser melhor – por e para eles, mas ganhei doses extraordinárias de solidariedade, afeto, carinho, atenção, amizade, enfim.
A saudade foi sentida de um jeito novo. Bem mais amargo, pois, é também, sinônimo de adeus. Estou aprendendo como dói ser órfã; nunca pensei que essa palavrinha, que sempre detestei, doesse tanto.
Setembro passou e o dia onze, que era apenas o dia em que a história dos EUA foi abalada por um ato terrorista, passou a ser para mim o dia do adeus. Da despedida. O dia em que a morte levou meu melhor pedaço. Minha referência mais forte e verdadeira. O primeiro homem que amei incondicionalmente. E, achando pouco, levou um irmão.
Somos [éramos] vinte e três, mas cada um tem seu lugar especial em minha vida e ele era aquele a quem eu confiava papai. Por sua dedicação e companheirismo. E ele resolveu ir até as últimas conseqüências em sua missão de nunca abandoná-lo.
Setembro, mês do aniversário de mamãe, agora é, também, o mês que perdi papai. Que a próxima primavera seja menos dolorida. Que até lá minha condição de órfã machuque menos o meu coração. Que meus olhos orvalhem menos e as flores de meus dias atraiam outros beija-flores.
Na próxima primavera não quero adubar meu jardim com os resíduos de minha dor, nem regar minhas flores com lágrimas de despedidas. Quero colher flores para ofertar aqueles que se foram, mas sem essa dor, sem este aperto no peito.