►► Suburbanos Sitiados ◄◄

   
Desde criança eu moro na zona norte do Rio de Janeiro, precisamente no bairro de Benfica, próximo ao bairro histórico de São Cristóvão. Sempre gostei do meu bairro e o acho até muito simpático, mesmo sendo cercado de favelas e de constantes assaltos.
    Hoje, vi que ninguém está seguro. Na televisão imagens de um helicóptero da polícia no meio de uma vila olímpica de uma comunidade carente, completamente destruído pelas chamas. O motivo da queda da aeronave? Acreditem, mas ela foi abatida por bandidos da favela qual ele sobrevoava.
    Vocês não estão entendendo. Uma cena de cinema! De filmes de guerra! Um helicóptero sendo abatido por traficantes de uma comunidade carente! E não parou por aí. O sábado estava apenas começando e os transtornos também.
    Depois do abatimento do helicóptero, a noticia que se seguiu foi de que ônibus estariam sendo queimados. E logo vieram as imagens. Três ônibus torrando em chamas na porta da favela do Jacarezinho. Imaginei o pânico dos passageiros ali dentro, sendo parados por bandidos armados e tendo que descer as pressas do veículo. Simplesmente impressionante. O mais impactante é que, enquanto na televisão, mostravam as imagens do ônibus pegando fogo e uma fumaça negra empestando o ar, ao chegar na minha janela eu podia ver a fumaça à alguns quilômetros. Eu estava presenciando o caos.
    Carros de polícia corriam com suas sirenes ligadas e indo em direção à favela. Parecia realmente cena de cinema. O trânsito parou. A avenida para a qual moro de frente, ficou deserta. Algo incomum para um dia de sábado.
    Saí da janela e fui para a frente da televisão. Mais ônibus sendo queimados. Ao todo eram cinco no perímetro da favela do Jacarezinho. A policia e os bombeiros tentavam conter as chamas, mas elas já haviam tomado conta dos veículos. Pessoas corriam amedrontadas. Outras se sentiam perdidas com as vias de acesso bloqueadas.
    Sinceramente não sei o que pensar nessas horas. Eu tinha compromissos e tive que cancelá-los devido ao caos urbano. Sitiado em plena cidade grande. Refém de uma guerra de traficantes que se tornou ainda pior com o envolvimento da polícia militar. Não pude sair de casa. Não pude ir até a esquina, pois moro próximo à uma favela que, na noite anterior, perdeu três de seus traficantes de maior autoridade, incluindo o chefe do tráfico, durante uma troca de tiros com a polícia.
    Fico me perguntando se fizeram bem em tornar o funk patrimônio nacional. Não querendo ser o chato da história, mas seria hipocrisia afirmar que é no baile funk das favelas que se vende o maior número de drogas? E com esse dinheiro os caras compram suas armas capazes de, por exemplo, derrubarem helicópteros? A gente tem que pensar. Tem que reorganizar nosso conceito de cidade. De direitos humanos...
    Passarei o sábado em casa. Não irei fazer o que tinha que fazer. Nesse momento o trânsito na avenida aqui na frente está totalmente parado. As pessoas estão com medo de seguir. Caminhões se amontoam por não poderem seguir por outro caminho. Terão que esperar debaixo da chuva que começa a cair. Sinto penas deles, sabe? Deve ser horrível ficar a mercê de um tiroteio que pode acontecer à qualquer instante.
    Acho que estamos numa guerra. Uma guerra que só traz problemas para nós cariocas. Ainda mais agora que iremos situar as olimpíadas. Sem contar que em 2014 temos uma copa do mundo para sediar também. As coisas precisam mudar até lá. Precisam parar de ser parecidos com o jogo “G.T.A” aonde você pode destruir monumentos, fazer arruaças pelas ruas e com algumas combinações de macetes e códigos, tudo é esquecido pelas autoridades.
    Caso não mude, nós continuaremos aqui, ilhados, sem ter para onde ir e, sem querer ser piegas, sem saber se voltamos para casa ao sair...
 

Fael Velloso
Enviado por Fael Velloso em 17/10/2009
Reeditado em 17/10/2009
Código do texto: T1871755
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