TEMPOS DE PRIMAVERA

Da minha janela do quinto andar, observo o espetáculo da reprodução das aves e plantas. Ainda ontem estava tudo tão cinza. Folhas caídas, galhos secos, pássaros encolhidos. Chuva e neve, água e ventania. De repente tudo se refaz como se fosse um milagre – e é! A brotação aparece de uma hora para outra. A passarada corta o ar em reboliço. Voam de cá pra lá, fazem ninhos nos lugares mais imprevisíveis. É preciso reproduzir! Os ventos fazem sua parte, sopram, assobiam, transportam. Uma pressa de vida se derrama no ar.

A palavra ‘primavera’ tem origem do latim ‘primo vere’, que significa ‘começo do verão’. Muitas primaveras se passaram desde que emplaquei por aqui – casualmente no mês de setembro. Algumas foram de cantos e muitas flores, outras nem tanto. Acho que é assim para todo mundo. Primavera, verão, outono, inverno... O importante é que toda estação vai e volta. Entre uma temporada e outra os amores e dissabores nascem, morrem, reciclam-se. Além de ser a estação onde a natureza floresce ao nosso redor, a primavera também é o período em que nossas almas ficam mais coloridas, cheias de ânimo e novas energias.

O escritor Jeocaz Lee-Meddi, brasileiro nascido em Goiás, que escreve sobre o nosso tempo e sobre o passado histórico – temos o ‘vício’ de pensar que só poetas e filósofos estrangeiros e mais antigos são donos de frases imortais – tem um pensamento que diz assim: “Não prometas nada que vá além da próxima primavera. Nenhuma fidelidade resiste à insatisfação humana, se assim o fosse, Adão estaria até hoje no Éden, fiel às promessas de Deus”. Desde que li isto, programo minha vida entre uma primavera e outra. O que durar mais, é lucro! Parece-me que a natureza toda se projeta desta mesma forma, no interstício das estações.

Também voltei a ouvir o sabiá nas madrugadas, entoando suas notas em vários volumes, escalas e variações, da copa do Flamboyant. Dizem que um sabiá não canta igual ao outro. Eu acho que é verdade. Cada sabiá tem sempre uma variaçãozinha, uma notinha diferente, um novo piado que avisa: - desse jeito só eu canto!

Só não tenho como saber se é o mesmo sabiá da primavera passada.