Peregrinos da Noite

O que leva o homem ao desespero? A deixar de lutar pelos seus sonhos? A não acreditar mais em si?... Talvez a frustração de tantos desenganos no decorrer de uma vida malograda!

Quando o sol não desponta na aurora de uma vida, deixando-a na inanição das trevas da noite, intrínseca e onipresente, nada de alegre pode invadir seus espaços escuros – cheios de tristeza, de dor, de angustia, de solidão e de morte.

Quem vive no dia, quem tem o sol ao seu lado, quem enxerga o mundo em sua plenitude, vê os pássaros da manhã cantando de alegria, as arvores frondosas com belos frutos, os rochedos intransponíveis do horizonte, os leitos serenos dos rios, o sopro suave do vento matutino. Caminha com firmeza, pois vê onde pisa. Mas, infeliz daquele que existe na noite, que o corvo amaldiçoado do infortúnio caminha e sobrevoa ao seu lado, que a solidão negra e a escuridão treda escondem tudo o que é vivo e reluzente – agora morto e apagado nas entranhas da noite imortalizada!

Eu sou um desses peregrinos da noite – de passo errante e tortuoso. Que o dia negou-lhe o viver. Que a maldição caminha lado a lado. Que aprendeu a conviver com as frustrações, com os desenganos, com as derrotas, com as traições... Tudo o que de ruinoso e dilacerante neste mundo dualista, em que uns têm tanto e outros tanto não têm nada, existe.

Entretanto, paradoxalmente contrário à realidade inexorável, não sei se pelos resquícios de luzes fugazes que, às vezes, a lua reflete quando sorrateira e repentinamente invade noite ou pela pueril e inconsciente quimera que sempre abrasa o coração humano, ainda tenho a ousadia de querer sonhar... De desejar o impossível!... Peregrinando nesta eterna noite taciturna.

(02 de novembro de 2006)