MARGARIDAS
Todas as segundas, quartas e sextas chova ou faça sol, elas invadem a rua que moro.
Eu sempre as observo,ora de minha janela, ora do pequeno quintal na frente de minha casa.
Vem sempre em cinco, conversando alto, rindo alto e às vezes até cantando algum sucesso sertanejo recente ou não, como que exorcizando saudades ou mágoas.
São as “Margaridas”.
Assim são conhecidas, pois vestem-se de uniforme amarelo. Nome delicado para quem exerce uma tarefa tão penosa, pois são as encarregadas de varrerem as ruas.
Seus nomes eu não sei: são anônimas, mas admiro tanto o trabalho destas mulheres, que me acho incapaz deprestar- lhes uma justa homenagem.
O trabalho dessas Marias...Josefas... Deusdetes ficaria mais fácil, se nós fizéssemos nossa parte, cumprindo regrinhas
simples de educação e higiene.
Elas mais recolhem nossos dejetos do que restos da própria natureza.
Abro meu portão, vou à calçada e as vejo quase na esquina, sentadas à beira da calçada, sob a sombra de uma quaresmeira, repartindo palavras e trocando entre si, o conteúdo
de suas marmitas.
A sombra é teto, a pedra é cadeira e as coxas são mesas.
Parecem felizes; se estão não sei, mas como a felicidade é momento, talvez estejam.
Após esse “almoço em família” surge um cafezinho de algum embornal e para uma ou outra um cigarrinho.
Depois levantam-se e continuam a varrer ... varrer ...varrer.
Já vão longe, quando reparo em um menino na calçada em frente, desembrulhar um picolé e despreocupadamente amassar o papel e jogá-lo na rua.
Minha vontade é repreendê-lo mas repenso pois não compete a mim e sim à seus pais, que talvez até já o tenham ensinado, ao invés disso, atravesso a rua, abaixo, recolho o pa -
pel, volto e o coloco em minha lixeira.
Talvez seja esta a única maneira de homenagear minhas “Margaridas”.