O menino que viu muita coisa

Maria vivia com a família numa favela. De vez em quando, no sábado, ela levava um dos netinhos para a casa de mamãe, onde trabalhava. Era um menino bonito e esperto. Todos nós gostávamos de conversar com ele.

Um dia, meu irmão João o chamou para dar umas voltas de carro e lá foi ele todo pimpão. Primeiro foram para os lados do Ibirapuera e o garoto ficou embasbacado com as avenidas, as árvores e o tamanho do parque. Depois, rodearam o estádio do Pacaembu e pararam ali perto. Torcedores chegavam em bandos, agitando bandeiras, fazendo batucadas, enquanto João contava como funcionavam os jogos de futebol. O menino maravilhado. Antes de voltarem para casa, meu irmão ainda deu umas voltinhas pelo bairro e adjacências. Acabou passando bem na frente do prédio onde morava Fernando Henrique Cardoso. Parou novamente e explicou que ali era a casa do Presidente da República. Disse também que ele trabalhava em Brasília, a capital do país, e quando vinha passar o fim-de-semana em São Paulo, chegava de helicóptero, que descia lá dentro do estádio. Os olhinhos do menino brilhavam...

Alguns dias depois, Maria chegou dando risada. Tinha sido chamada na escola do neto, situada lá no bairro deles. A professora, toda circunspecta, estava preocupada com o garoto. Através de uma redação que ele havia feito, desconfiava que pudesse estar com algum problema. Não diria que se tratava de alucinação, mas começava a apresentar um certo distúrbio. Mania de grandeza, talvez...