Cascais by night

Depois que fomos ao sítio e vimos o presépio em tamanho natural, o portuguesito passou por outro sítio e pegou uma senhora. Amiga e companheira de carteado do mancebo. Este, ao volante, anunciou que íamos a Cascais, onde encontraríamos outros companheiros de jogo.

Jogar baralho em português de Portugal, ainda mais na exaustão em que me encontrava, era a última coisa que eu tencionava fazer naquela noite, a terceira mal dormida da semana. Na véspera do Natal, festejara com a família. Na noite seguinte, véspera da viagem, o assanhamento não me deixou pregar o olho e a última, a da viagem, passara no avião. Confesso que naquele momento só a curiosidade me fazia permanecer de olhos abertos. Aliás, de ouvidos também. E como!

Pena que o passeio não tenha sido feito de dia, pois nada vi da paisagem. Quando dei por mim, chegávamos à casa dos tais amigos, onde fui recebida com muito entusiasmo. Várias pessoas lá se encontravam e todas queriam falar comigo, às vezes, todas ao mesmo tempo. Fraldas espalhavam-se por cima dos aquecedores e não demorei a perceber que naquela casa havia um bebê. Logo o bebê também percebeu que algo diferente acontecia e pôs-se a berrar.

Naquela noite não houve jogatina. A mãe precisou cuidar do bebê e seus parceiros cuidaram de mim. Todos eles, muito interessados no Brasil, me torpedeavam de perguntas, às quais eu ia respondendo devagar, caprichando para que me entendessem. Aos poucos, porém, já não compreendia mais o que me perguntavam e nem caprichava tanto. Passei a dizer sim ou não. Foi então que alguém se lembrou de que um acontecimento importante seria transmitido pela televisão.

Não sou capaz de dizer que acontecimento foi este, pois a partir do momento em que ligaram o aparelho, tudo ficou mais complicado. Meus olhos iam da televisão para meus interlocutores e dos interlocutores para a telinha. Suas vozes foram se distanciando, eu não conseguia mais entender o que diziam e, mesmo sem ter bebido nada, comecei a ficar tonta. Tinha a impressão de que a sala balançava e as pessoas rodavam a minha volta, cada vez mais rapidamente. A voz do locutor se sobressaía, mas ele falava uma língua incompreensível. Eu, no meio do redemoinho, comecei a afundar. De repente, tudo escureceu.

Não sei quanto tempo se passou, sei é que me sentia bem melhor quando me acordaram. Era hora de voltarmos a Lisboa.