Quando o passado consome presente - O caso do prego!

Esse prego ainda está aí? Tire esse prego da parede pai. “Não se pode arrancar o passado da gente”. Faz tanto tempo que aquela dona se passou, há tanto que o corpo esfriou! O vestido que pendurava nesse prego para lembrar o mal feito já não dá mais jeito, as rendas se desfizeram como sal na água e mesmo assim você não tira pai. A mãe morreu de triste por conta do prego e do vestido. “Vossa mãe não morreu por conta do prego minha filha, vossa mãe morreu de amor encruado, coração amargurado. Vossa mãe morreu por conta “do cheiro insuportável da memória””. Então pai, não vê que esse prego exala o mesmo cheiro? Os fiapos de renda exalam a cheiro de morte da mãe. Eu não quero lembrar disso pai. E não diga que lembrar o mal passado faz o bem ser desejado. Nem sei por quanto tempo esse prego taí com esse vestido e nem por isso a mãe viveu. O prego lembra a dona pela qual o pai se perdeu. É por isso que não arranca o prego pai? Não se desprende da dona de colo nu que te prendeu? Toda vez que a mãe olhava pro vestido no prego molhava os olhos com o sumo salgado de quando espreme o coração. “Porque choras minha mãe?” ela dizia: “Só pra não explodir! Não pergunte mais minha filha, teu pai já está por vir”. Ah meu pai, esse prego me dói tanto que às vezes parece pregado em mim. -“Mas ele está minha filha! Assim como está em mim, assim como pregou a lápide de sua mãe. Não arranco não porque me lembra a dona que passou, mas porque lembra o amor que sua mãe dedicou. Eu não vou me desprender desse passado, será pra sempre o meu fardo.” Ah pai, se soubesse como sofro quando olho pra esse prego, essa memória! Não agüento mais o cheiro dessa história. Tire o prego da parede pai! -“Vá viver minha filha! Vá viver que a vida é transitória”. Mas você não vem pai? -“Não filha. Minha chance já foi dada: está morta. Enterrada”. Mas se tirar o prego talvez tem outra chance – “o prego não vai tirar a dor do peito. Não tem jeito.”