BANZÉ
Uma tarde ele surgiu na rua, acompanhado por outro vira-latas, preto que nem ele, os dois na maior algazarra. Corriam pra lá e pra cá, se engalfinhavam às vezes numa luta verdadeira, rosnando e mordendo-se um ao outro sem a menor cerimônia.
Isabela, minha netinha de apenas dois anos, o viu e logo se encantou:- o cãozinho chegou próximo ao portão, fiz-lhe cócegas na cabeça, ele abanou a cauda, feliz e agradecido. Vagabundo, não estava acostumado a tais agrados. Fomos à cozinha e trouxemos pedaços de pão velho. O cachorrinho comeu tudo, faminto, ganancioso.
Minha filha Ana Claudia, mãe da Isabela, o apelidou de “Banzé”, tal a semelhança extraordinária com o cão do desenho animado. E o apelido pegou.
Os dias foram passando, o “Banzé” se tornou freqüentador assíduo do nosso portão, mormente à tardinha, quando eu chegava do trabalho. Isabela vinha correndo (“- Vovô
chegou, vovô chegou ...”), pulava no meu pescoço, pedindo colo (“- Colinho, colinho ...”) e gritava:-
“- Vovô, Banzé, Banzé?! ...”
Eu assobiava estridente e o vira-latas aparecia ligeiro, vindo não sei de onde. E fazia por merecer suas migalhas de pão, as cócegas na cabeça.
Num sábado, Isabela partiu de volta pra São Paulo, ao encontro do pai, Décio, juntamente com a mamãe Ana Claudia e o seu irmãozinho Victor, o mais novo. Ficou um imenso vazio lá em casa, uma enorme saudade nos machucando o peito, principalmente ao cair das tardes, hora do “Banzé” chegar. Sua vovó Maria Mari chegava a chorar, tadinha.
Só que ele não apareceu e não voltou mais, nem no nosso portão e nem na rua lá de casa. Simplesmente sumiu. Fiquei intrigado.
Minha filha telefonou de São Paulo, Isabela tomou-lhe o aparelho e gritou do outro lado da linha:-
“- Vovô, cadê Banzé, cadê Banzé??? ...”
Fiquei aflito, peguei a máquina fotográfica e saí pelas redondezas, na esperança de encontrá-lo e fotografá-lo para enviar o retrato à Isabela. Quem sabe isso não a contentaria? Mas nada! ...
Foi então que a vizinha da casa de cima, Dona Leia, me disse:-
“- Ah, seu Roberto, aquele cachorrinho preto foi atropelado na rua de baixo e morreu. Foi por isso que ele sumiu daqui ...”
Entristecido, pedi-lhe para fotografar o cãozinho preto da sua casa, o companheiro de aventuras do “Banzé”, e voltei amargurado, pensando em como fazer para dar a notícia à minha neta Isabela ...
-o-o-o-o-o-