Camisa de estampa de oncinha
Quando ele chegou para o ensaio não dei nada por ele.
Aquela calça preta semi bag, um par de tenis surrados e uma camisa de mangas arregaçadas com estampa de oncinhas.
Achei uma figura.
Além do mais o cara era canhoto, enfim para mim estava tudo errado.
O corte do cabelo era bem curtinho, e ainda tinha uma mochila preta dessas bem caretas.
O Marlo disse daqui cinco minutos vamos começar uma jam session.
O Cara, tirou da mochila uma bandana, arrumou na cabeça, descolou um óculos escuros, tipo John Lennon, redondinhos, pôs quatro anéis um em cada dedo, menos no polegar, pegou um chiclete e ficou mascando o tempo todo.
Pensei comigo.
Mascarado !
Agora só falta não tocar nada.
Pegou o baixo e começou fazendo um tremendo groove.
Maior swing e logo os demais seguiram aquele ritmo gostoso.
Ele ditava o balanço e a bossa.
Caramba !
O cara é bom.
Aquele magrelo com quase dois metros de altura, estava conquistando todos, e para surpresa nossa, ele foi trocando os instrumentos.
Deixou o baixo, foi para guitarra e da guitarra deu um solo de bateria de deixar todos de queixo caídos.
Bebeu quase todas nossas cervejas, o cara era um copo furado.
Ninguém se importou, tambem puderá, ele era bom demais.
Encantou a todos.
Sabia tudo de música. Um ouvido universal.
Alguém conseguiu ouvir dele seu nome.
Falou em voz baixinha, meu nome é Chuby.
Pouco se soube a mais.
O negócio dele era tocar e dançar.
Quando foi ao banheiro, por lá ficou mais de trinta minutos, impedindo a todos de fazerem suas necessidades.
Sem cerimonia filava cigarros dos fumantes.
Os que chegavam depois, perguntavam, quem é esse cara ?
Todas as perguntas eram respondidas monossilabicamente.
Algumas respostas aqui transcrevo: sim, não, é, sou, fiz, li, toquei, Putz, bixo, loki, tô, Thanks.
Claro foi o último a ir embora, depois de vasculhar a geladeira e filar mais uns dois cigarros e dedilhar mais um pouco na guitarra.
Não perguntou quando nos encontrariamos de novo, nao perguntou o nome de ninguém, e nem fez nenhum comentário sobre os músicos e sobre a banda em geral.
Fomos andando em grupo e ele ficou num ponto de ônibus para zona norte.
De longe ainda me virei e vi o Chuby ali reclinado numa mercedes, como estivesse dando informação.
Cutuquei o Marlo e disse olha o Chuby ali agachado na janela da mercedes...
Quando Marlo tentou ver...
não havia mais mercedes muito menos o Chuby.
No ensaio seguinte, parecia que a qualquer instante, ia adentrar o Chuby.
Mas nada disso, e ficou um vazio danado.
Aquele cara esquisito esta fazendo falta, e minha lembrança além do som maravilhoso que ele fazia era aquela camisa de estampa de oncinha combinando com sua bandana.
Aí Chuby, pode voltar e beber todas as cervejas, fumar todos os cigarros e responder só com monossilabos.
Mas nos brinde com seu som.