fila do banco

Há uns anos eu estava numa fila de banco e vi uma cena triste. Triste e meio revoltante também. É preciso lembrar que há alguns anos se pagava contas na “boca do caixa”, com atendentes, e não no caixa eletrônico. A fila, então, estava enorme e justamente esse fato quer possibilitou a ocorrência dessa cena.

Eu era a última das mais de dez pessoas que aguardavam o atendimento, que era lento, pois só havia dois caixas disponíveis. Mais gente chegava quando uma moça parou no meio do salão, parecendo buscar coragem de dentro de si. Respirou fundo, tirou um papel da bolsa e começou a chorar.

“Gente, boa tarde”, disse entre soluços tristes, “eu tenho AIDS”. A moça estava simplesmente desesperada. O tal papel em sua mão era uma receita de um remédio que com certeza não teria como comprar. E ela mostrava a receita a todos da fila, dizendo quanto custava e quanto faltava para chegar aquele valor. Conforme um ou outro ajudava, ela agradecia sinceramente e proclamava um valor menor que lhe faltava.

Essa angustiante contagem regressiva continuou até chegar a uma quantia pequena, algo como dois reais. E eu, sem nenhum tostão furado no bolso além do que tinha para pagar a minha conta, assisti àquela cena, muda, torcendo pela moça. Foi quando o segurança do banco chegou e disse à moça que ela não poderia fazer aquilo. Mas ela não estava fazendo nada de mais! Não estava roubando, não estava obrigando ninguém. E não estava mentindo, pois mostrava a receita médica e um documento de identidade. Mas não poderia pedir esmola na fila do caixa de um banco.

O que me irritou foi que, por que o segurança não chegou antes? Por que deixá-la ter um pouco de esperança? Ninguém reclamou ou praguejou; os que podiam ajudar, ajudaram. O segurança parece que só chegou para lembrá-la de que estava se humilhando em público.

Alguém intercedeu pela moça. Uma pessoa completou o que estava faltando para o segurança não enxotá-la e a moça, feliz por ter tido coragem de se humilhar, agradeceu muitas vezes e saiu. O segurança, obsoleto, voltou ao serviço. A vida voltou ao normal como se nada tivesse acontecido. E eu nunca mais esqueci aquela moça. Continuo sem grana, mas ainda torço por ela. Para que continue tendo força para lutar para viver.

Deborah O’ Lins de Barros

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Deborah O Lins de Barros
Enviado por Deborah O Lins de Barros em 02/10/2009
Reeditado em 02/10/2009
Código do texto: T1844064
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