84 - ENTRE TIROS, LENÇOS E CUECAS...
Todo contador de histórias e causos quase sempre começa dizendo que a mesma é verdadeira. Da mesma forma, as histórias antigamente começavam assim: Era uma vez...
Lá na oficina mecânica de caminhões da Jacutinga, na Mina Cauê, um cara bem trapalhão viu um armário aberto com uma arma enfiada no coldre, mesmo não sendo dele o armário, foi logo sacando a arma sem nem ao menos pestanejar e observar se estava carregada ou não. Deu no gatilho! Uma, duas, três!
Foi aquele estrondo, aumentado pelo fato de ele ter atirado dentro do armário, seguido daquele corre-corre dentro da oficina. Uns para ver o acontecido, outros, tendo percebido barulho de tiros, e tendo alguma culpa no cartório foram logo pensando tratar-se de um ajuste de contas. Uns se enfiaram debaixo de caminhões, outros pularam sobre as bancas e permaneceram escondidos como se fosse um tiroteio no saloon como nos Bang!Bang! lá dos cines Itabira e Atlético.
A arma era um “trêsoitão” que um menino recém chegado do SENAI levara para mostrar e contar vantagens aos outros, mostrando que também já era homem; como se a arma tivesse o poder de transformar alguém em homem!
Naquele tempo, homem que era homem, ou pretenso, vivia arrastando papo, dizendo que dormira na curva da Estação ou na Água Espalhada (Espraiada) e que tomara a namorada do outro ou a mulher de alguém.
No fundo do armário, um espelho tamanho 40X30, bem ao lado do buraco que a bala fizera, aparecia uma imagem de olhos arregalados e não vou dizer que neguinho estava branco de medo, aí já seria demais. Mas que ele estava mesmo era cinzento como o Valentim, irmão do Victor, lá isso estava! Aliás, cinzento e tremendo feito rabo da biruta lá do aeroporto. Jogou a arma no fundo do armário, como se o diabo estivesse dentro da mesma ou ela estivesse pegando fogo. Quando ele conseguiu falar do que fizera, já tinha saído do cinza claro e brilhava como uma grande berinjela, suando feito João Cauby, quando fora corrido pelo Faísca lá da sedinha da Vila Coração de Jesus, por ter dito que não sabia o que fora fazer lá no pé de pomba. Naquela ocasião, João Cauby fora atender um chamado para cantar num baile promovido pelo Seu Antônio Itabirano, em homenagem ao dia das mães. Além de cantar muito bem, tinha um vozeirão que justificava o apelido, mas era também muito tirado, quero dizer,metido a besta. A cada canção tirava de uma caixa um lenço branco, enxugava o rosto e as mãos e passava nos sapatos Schattamachia bico fino, e atirava o lenço como se fosse uma rosa, bem no meio do salão. Aquele seu gesto foi enchendo o Faísca e o Corintão, que já estavam querendo acertar o folgado em pleno salão. Várias vezes fizeram gesto de arrancá-lo do palco, o que só não foi feito atendendo aos pedidos para não estragar a festa. Só sei que no intervalo, quando a orquestra fez uma pausa e entre uma música e outras tocadas lá vitrola, Anísio Silva e Miltinho atacavam de boleros e outras músicas lentas e românticas. João Cauby saiu de fininho pela porta lateral do palco, subiu nos engradados do fundo do bar, pulou a cerca do vizinho, caiu no meio dos pés de chuchu e abóboras que cobriam a cerca feita de tela de peneira minério e arame farpado. Saiu vazado, correndo feito louco, em direção da estradinha que ligava o bairro Campestre ao aeroporto. Chegou em sua casa, no berra lobo, com o paletó de linho branco na mão, calça rasgada na bunda e a promessa de que galo do terreiro alheio não voltaria a cantar, não importando o motivo do evento, nem se dinheiro houvesse.
Voltamos ao tiroteio, onde a vítima principal foi o armário. Só mais tarde se soube que duas cuecas samba-canção tiveram que ser lavadas e colocadas pra secar lá na estufa dos filtros, pois bem ao som dos tiros que ficaram em volta do espelho, um em cima, outro embaixo e outro do lado direito, um mecânico e um ajudante de transmissão e caixa, acabaram “perdendo o freio” e rebocando as calças.
Hoje, mais de quarenta anos do acontecido, perguntem ao Mauro Pelé se ele se lembra do fato. Não importa onde ele esteja, seja na igreja ou no baile, ele deita e rola de tanto rir, mas garante: o primeiro tiro foi sem querer, os outros dois foram de susto e medo do danado do revólver. O Plínio, dono da arma, chegou sem camisa, com a toalha na mão, pisando sob os calcanhares das botinas, dizendo “o que foi que aconteceu? Esta arma é minha!”
Pelos olhares, naquela hora, quase que o fuzilado foi ele.
Todo contador de histórias e causos quase sempre começa dizendo que a mesma é verdadeira. Da mesma forma, as histórias antigamente começavam assim: Era uma vez...
Lá na oficina mecânica de caminhões da Jacutinga, na Mina Cauê, um cara bem trapalhão viu um armário aberto com uma arma enfiada no coldre, mesmo não sendo dele o armário, foi logo sacando a arma sem nem ao menos pestanejar e observar se estava carregada ou não. Deu no gatilho! Uma, duas, três!
Foi aquele estrondo, aumentado pelo fato de ele ter atirado dentro do armário, seguido daquele corre-corre dentro da oficina. Uns para ver o acontecido, outros, tendo percebido barulho de tiros, e tendo alguma culpa no cartório foram logo pensando tratar-se de um ajuste de contas. Uns se enfiaram debaixo de caminhões, outros pularam sobre as bancas e permaneceram escondidos como se fosse um tiroteio no saloon como nos Bang!Bang! lá dos cines Itabira e Atlético.
A arma era um “trêsoitão” que um menino recém chegado do SENAI levara para mostrar e contar vantagens aos outros, mostrando que também já era homem; como se a arma tivesse o poder de transformar alguém em homem!
Naquele tempo, homem que era homem, ou pretenso, vivia arrastando papo, dizendo que dormira na curva da Estação ou na Água Espalhada (Espraiada) e que tomara a namorada do outro ou a mulher de alguém.
No fundo do armário, um espelho tamanho 40X30, bem ao lado do buraco que a bala fizera, aparecia uma imagem de olhos arregalados e não vou dizer que neguinho estava branco de medo, aí já seria demais. Mas que ele estava mesmo era cinzento como o Valentim, irmão do Victor, lá isso estava! Aliás, cinzento e tremendo feito rabo da biruta lá do aeroporto. Jogou a arma no fundo do armário, como se o diabo estivesse dentro da mesma ou ela estivesse pegando fogo. Quando ele conseguiu falar do que fizera, já tinha saído do cinza claro e brilhava como uma grande berinjela, suando feito João Cauby, quando fora corrido pelo Faísca lá da sedinha da Vila Coração de Jesus, por ter dito que não sabia o que fora fazer lá no pé de pomba. Naquela ocasião, João Cauby fora atender um chamado para cantar num baile promovido pelo Seu Antônio Itabirano, em homenagem ao dia das mães. Além de cantar muito bem, tinha um vozeirão que justificava o apelido, mas era também muito tirado, quero dizer,metido a besta. A cada canção tirava de uma caixa um lenço branco, enxugava o rosto e as mãos e passava nos sapatos Schattamachia bico fino, e atirava o lenço como se fosse uma rosa, bem no meio do salão. Aquele seu gesto foi enchendo o Faísca e o Corintão, que já estavam querendo acertar o folgado em pleno salão. Várias vezes fizeram gesto de arrancá-lo do palco, o que só não foi feito atendendo aos pedidos para não estragar a festa. Só sei que no intervalo, quando a orquestra fez uma pausa e entre uma música e outras tocadas lá vitrola, Anísio Silva e Miltinho atacavam de boleros e outras músicas lentas e românticas. João Cauby saiu de fininho pela porta lateral do palco, subiu nos engradados do fundo do bar, pulou a cerca do vizinho, caiu no meio dos pés de chuchu e abóboras que cobriam a cerca feita de tela de peneira minério e arame farpado. Saiu vazado, correndo feito louco, em direção da estradinha que ligava o bairro Campestre ao aeroporto. Chegou em sua casa, no berra lobo, com o paletó de linho branco na mão, calça rasgada na bunda e a promessa de que galo do terreiro alheio não voltaria a cantar, não importando o motivo do evento, nem se dinheiro houvesse.
Voltamos ao tiroteio, onde a vítima principal foi o armário. Só mais tarde se soube que duas cuecas samba-canção tiveram que ser lavadas e colocadas pra secar lá na estufa dos filtros, pois bem ao som dos tiros que ficaram em volta do espelho, um em cima, outro embaixo e outro do lado direito, um mecânico e um ajudante de transmissão e caixa, acabaram “perdendo o freio” e rebocando as calças.
Hoje, mais de quarenta anos do acontecido, perguntem ao Mauro Pelé se ele se lembra do fato. Não importa onde ele esteja, seja na igreja ou no baile, ele deita e rola de tanto rir, mas garante: o primeiro tiro foi sem querer, os outros dois foram de susto e medo do danado do revólver. O Plínio, dono da arma, chegou sem camisa, com a toalha na mão, pisando sob os calcanhares das botinas, dizendo “o que foi que aconteceu? Esta arma é minha!”
Pelos olhares, naquela hora, quase que o fuzilado foi ele.