Dois sinos e um retorno

Com musicalidade garantida a população acordou cheia de vida. O segundo sino retornou das férias sem badalo num domingo de neblina. Compreendi que algo havia mudado, retornado ao que era antes. Como se fosse possível acordar para rever nossos mortos diante dos olhos vivificados dessa saudade lenta, cruel e dolorosa.

A poucos dias da abertura da primavera estava de volta na torre o badalo de bronze extraviado no silêncio a que se devotou pela ausência de alguns anos. Preenchendo a bocarra do objeto além da nostalgia. Bem em frente à estátua do comendador que parecia sorrir diante do regresso. Decerto o jornal que relatou o sumiço noticiaria também a ressurreição da melodia, tão conhecida dos hábitos rotineiros da cidadezinha. Que louvável revelação. Reconheci nas badaladas o velho som de sempre diante do elevado entusiasmo que corresponde a dois sinos badalando.

Compreendi auditivamente enquanto caminhava que ele havia retornado. Realmente estava no lugar, como antes, graças aos intrépidos operários, que nas alturas, soldaram o objeto, devolvendo-lhes a harmonia final ao seu curso de som. Continuei meu caminho de poeira levado por discreta felicidade. Alacridade que o padre decerto abençoaria mesmo retrucando minha consciência laica.

Foi um domingo de felicidade, sinos e pardais.