RAINHA DA PRIMAVERA

RAINHA DA PRIMAVERA

Alguém lhe dissera que ela era uma garota muito linda. Bastou-lhe seu espelho de quarto para constatar que o romântico vaticínio do poeta não fora falho. Portava-se, pois, segundo as normas sociais intrínsecas ao belo – fartos, caros e impecáveis vestidos e sapatos; cosméticos e cremes e perfumes, sem, no entanto, parecer-se “perua”, e todo o mais que se move em torno do enaltecer-se essa dádiva da natureza.

Adolescente, já primorosamente dotada dos atributos da mulher adulta – alta, esbelta, magra, mas, com as carnes todas colocadas simétrica e esteticamente nos lugares devidos. Seu cabelo era loiro ouro, curto, brilhante à luz do sol daquela primavera, com madeixas a fazer-lhe charminho no rosto de uma beleza incomum. Os olhos lhe eram castanhos claros, grandes, magnéticos, com a travessura da idade, de invejáveis cílios longos. Entre o narizinho mimoso e o queixo bem feito, denotando a origem germânica, havia lábios – que lábios! – carnudos, molhados, convidativos, sempre se movendo em ritmo de paixão. A voz era suave, doce, mansa – o sussurro do amor.

Havia, porém, a par de tantos e prendados atributos, mais um, que fazia a diferença – educação. A natureza moldara-lhe o corpo no protótipo de Vênus – perfeito; os pais, oriundos da antiga escola de educadores domésticos, hoje obsoleta e, apesar dos pesares, repudiada, proveram-lhe o espírito dos dotes morais, intelectuais e de inconfundível educação e boas maneiras, que completavam o universo dessa candura.

Valorizou-a o meio. A hoste social, empanada com o jovem esplendor plebeu sobre pezinhos de princesa, fê-la, realmente, a “princesa” ao lado da Rainha da Primavera.

Ele, também servo de Deus, era moço garboso, dotado de máscula juventude e beleza, alto, atlético - um viril cavalheiro, botando charme por todos os poros. Foi fadado, para sua ufana glorificação, por ordem dessa mesma sociedade, a oferecer à sua princesa, o braço para acompanhá-la ao trono do Palácio do Clube União, onde o belo casal faria as honras à rainha eleita, no ato de sua coroação para dirigir o destino dos súditos daquela sociedade até a próxima primavera.

Afonso Martini
Enviado por Afonso Martini em 27/09/2009
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