CAÇADA

Eita Cedro velho, meu querido torrão natal! ... Quanta saudade, quanta lembrança boa eu tenho de você e sua gente humilde, suas ruas poeirentas, o carro de bois chiando, carregadinho de milho, o casario branco de telhado baixo, os grandes quintais cheios de árvores frutíferas, mangas, goiabas, cajus, ameixas, jabuticabas, abacates, limas, mamões, tamarindos, amoras e mexericas, o rio, a praça, a igreja e o coreto.

Sob o coreto, aos domingos, após a missa, a banda engalanada tocava belos dobrados, enquanto as moças sorriam, dengosas e desfilavam ante os olhares acanhados dos rapazes de roupa engomada.

A saudade aperta o peito, as cenas da minha infância passam rapidamente pela memória, os amigos de traquinadas, das peladas de todas as tardes no campinho de terra vermelha, as caçadas de passarinho, os banhos no c'orgão. Tempo bom! ...

Meu padrinho Fulô era respeitado no lugar, mercê das suas qualidades como bombeiro-hidráulico e, principalmente, por sua fabulosa pontaria, ele caçador famoso. Tinha um cachorro perdigueiro, o “Buick”, muito bem treinado, farejador incrível, que levantava muita codorna e perdiz no cerrado, as quais terminavam sempre abatidas pela cartucheira infalível do Fulô.

Aos sábados, domingos e feriados, quando não havia trabalho na fábrica de tecidos, meu padrinho preparava a mochila e saíamos, com o “Buick” saltitando, feliz, em direção ao cerrado próximo. Eu curtia cada arbusto, cada picada de mato, a fonte d’água escondida no capão, o riacho cristalino que atravessávamos, os pés de pequi, a vegetação característica que tanto me fascinava. Maravilhado, não sentia cansaço e vencia as distâncias com animação.

“Buick” corria longe, farejando aqui e ali, até estancar de súbito. Parado, imóvel qual uma estátua, os olhos fixos num determinado ponto, uma pata no ar, só o rabo balançando rápido, demonstrando o seu contentamento pela presença da caça.

Padrinho Fulô chegava, carabina em condição, cauteloso. A poucos metros do seu cachorro, ordenava o ataque, o perdigueiro se lançava em direção à touceira de capim à sua frente, a codorna alçava seu vôo ligeiríssimo, ruflando as asas e sibiliando num ruído próprio dela.

O caçador mirava, acompanhando o vôo rápido e os meneios do pássaro. Fogo! A codorna caía, numa poeira de penas, chumbada de morte. O perdigueiro corria ao local, latindo, e voltava feliz com a caça na boca para a entrega ao seu dono, sentindo-se recompensado pelo seu trabalho, a amarração.

E, mais uma vez, venceu o senhor branco! ...

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RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 27/09/2009
Reeditado em 01/05/2012
Código do texto: T1834120
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