CÓDIGO DE NAMORO

Os tempos mudam, as coisas e os costumes se transformam. O que era de um jeito ontem é assim hoje, o antigo mudado para o jeito moderno de se fazer as coisas atualmente.

Garoto ainda, onze, doze anos talvez, eu experimentava as primeiras sensações no terreno amoroso, atraído pelas mocinhas da minha terra natal, o Cedro (hoje Caetanópolis), no “footing” das tardes e noites domingueiras na praça da Igreja, ao som das marchas e dobrados executados com perfeição pela “Euterpe Santa Luzia”, a famosa banda de música regida pelo maestro Zebedeu.

Maior do que a vontade de abordar as moças era o nosso acanhamento, de forma que usávamos um expediente singelo:- um cartãozinho impresso com os dizeres “Posso falar com você?”, e em cada canto do cartão “Sim”, “Não”, “Talvez” e “Por que?”.

Se a garota simpatizasse com o pretendente, devolvia o cartão com a ponta do “Sim” dobrada. Caso contrário, era a ponta do “Não” e assim por diante.

A resposta que mais nos afligia era o “Talvez”, que aumentava as dúvidas e incertezas dos nossos pequeninos corações pré-adolescentes.

Mil vezes preferível um “Não”, seco, direto, porém a nos deixar livres e disponíveis para uma outra tentativa de relacionamento. O “Por que?”, se não era desejado pelo menos não era temido, pois já permitia uma aproximação e o garoto procurava a garota e dizia:-

“- Porque eu acho você bonita ...”, ou ‘Porque eu quero namorar com você”, etc. . Mas o “Talvez” era o bicho.

Hoje a corte se faz de modo diferente, eles se paqueram e o rapaz “fica” com a moça se ela consente. Não raro ela toma a iniciativa da abordagem e dá a “cantada” no moço, numa inversão da ordem antiga.

Naqueles tempos da minha garotice, enviei um cartãozinho desses à mocinha bonita de nome Clara, filha do Mané Serrador e irmã do Zé Chilau, bastante cortejada pelos rapazes da minha terra, o Cedro. Ela devolveu o cartão com a ponta do “Sim” dobrada e principiamos um namoro tímido, onde nem as mãos, nem as pontas dos dedos se tocavam! Santa inocência! Foi namoro breve, fugaz e morreu no fim das minhas férias escolares, quando tive que regressar à capital mineira.

Nenhuma fada madrinha, nenhum gênio da Lâmpada Maravilhosa me apareceu para dizer que aquela menina gordinha, charmosa e bonita se transformaria alguns anos mais tarde na famosa cantora Clara Nunes, morta depois, precocemente, e chorada pelos fãs de todo o Brasil até hoje.

Além de alguns discos seus, com músicas de muito sucesso, guardo comigo a lembrança e o cartãozinho dobrado no “Sim”, um atestado puro e infantil do romantismo que predominava naqueles saudosos tempos.

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RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 25/09/2009
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