Anjos

Fatos inusitados estavam acontecendo naquele prédio, água derramada de baldes, sabe-se lá de qual apartamento, caiam sobre o coitado do zelador, bexigas com água voavam sobre os pedestres, assim como aviõezinhos carregados com pó teimavam em sujar as pessoas que passavam por ali, as janelas amanheciam com jornais molhados colados nos vidros, na porta dos apartamentos sacos de lixo impediam a saída dos moradores da própria casa, o síndico, cansado de receber as reclamações, convocou uma reunião extraordinária, com todos os moradores, e informou com todas as letras que os envolvidos seriam devidamente penalizados com multas. O caos estava instalado, agora as pessoas faziam vigília para descobrir os culpados, insultos, acusações e insinuações eram disparados para todos os lados, dedos em riste e pais quase chegando as vias de fato.

Os únicos alheios a confusão era a família do apartamento 103, o comportamento exemplar dos filhos e a educação daquelas pessoas os tornavam absolvidos de qualquer suspeita, a cada reunião usavam-os como exemplos. As semanas se passavam e nada sabiam dos responsáveis, a bagunça generalizada, provocava no síndico as mais longas noites de insônia, medidas drásticas precisavam ser tomadas para a busca de uma volta à calma, os moradores procuravam pistas como verdadeiro Sherlock Holmes, mas o autor ou os autores pareciam muito mais espertos, simplesmente não deixavam vestígios. E o síndico não teve dúvidas, chamou a polícia, o que acabou desagradando muita gente, que naquele momento não se interessavam pela entrada da polícia no caso, mas isto é outra questão, naquele momento procuravam-se os culpados pela desordem no prédio.

Na última reunião, revoltados, tinha ficado definido que ninguém pagaria mais os condomínios enquanto não esclarecesse o caso, as principais suspeitas depois de algumas “investigações” recaiam sobre a família do oitavo andar, que possuíam nada mais do que três filhos encapetados, diferente da família do décimo andar, que todos viam nos seus filhos como anjos. Quatro meses após o início do caos, a mãe dos “anjos” ao verificar em sua bolsa o esquecimento de um importante documento, voltou rapidamente para casa, abriu a porta e estranhou o silêncio dentro do apartamento, procurou pelos dois filhos e, viu o que nunca acreditou que poderia um dia ver, enquanto um enchia as bexigas com água o outro se divertia atirando-as lá de cima, distraídos com a “brincadeira”, não perceberam que sua mãe saia lentamente do local sem dizer uma única palavra.

Na reunião seguinte, pediu a palavra ao síndico, agradeceu muito, pelo tempo em que moraram no prédio, que sentiriam saudades de todos, mas que precisavam residir em outro local devido ao trabalho, chorando despediu-se mais uma vez de todos, o casal saia abraçado levando com eles os seus filhos “anjos”. No dia seguinte a mudança, nada mais acontecia no prédio, voltava à paz novamente, o síndico, aliviado com a situação, voltava a dormir o sono dos justos. Quinze dias depois convocava, a que seria a última reunião sobre os episódios ocorridos, no seu discurso sentia em sua voz uma lamentação:

- Como vocês podem perceber, há quinze dias, “graças a Deus”, não acontece algo referente aos fatos que atormentaram durante os últimos quatro meses, infelizmente perdemos um dos nossos melhores moradores, e como vocês mesmos presenciaram em nenhum momento demonstravam claramente a vontade de sair, não sabemos realmente se saíram por causa do trabalho ou devido a esse problema que tanto nos incomodou e os incomodaram, fica a certeza que se tivéssemos resolvido rapidamente a questão, eles ainda estariam entre nós, fica o exemplo. Até hoje não sabemos dos verdadeiros responsáveis pelas “brincadeiras” de mau gosto, mas o que podemos perceber é um arrependimento dos mesmos, vendo aquela senhora do103 emocionada, chorando ao se despedir, pois logo a saída deles cessou os acontecimentos.

Com o fim do discurso, todos se olhavam a procura de um réu, afinal alguém “entre eles” provocara toda aquela confusão.

Regor Illesac
Enviado por Regor Illesac em 25/09/2009
Código do texto: T1830029
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