SÓCRATES NA PRAÇA DOS TRÊS PODERES
Já era o final da tarde de um domingo quando eu visitei a Praça dos Três Poderes e, num primeiro momento, quanta felicidade ao contemplar tão belos esses traços, tão leves essas linhas! Quanto beleza! Quanta alegria!
O primeiro prédio que fitei, foi o Congresso Nacional, sede do Poder Legislativo Federal.
O conjunto de prédios é composto de dois edifícios altos e duas conchas, uma emborcada para baixo e outra desemborcada.
À minha esquerda (da concha desemborcada), encontra-se o edifício onde funciona a sede da Câmara dos Deputados. Passando os olhos, pude visualizar, na minha mente, o que continha por dentro: o salão verde, um grande salão que fica logo embaixo da concha desemborcada, onde se aglomeram e transitam o povo, os jornalistas e os Senhores Deputados. Esse salão, cuja iluminação é mais aberta e os espaços maiores, também se encontram duas esculturas em bronze de muito significado artístico e político: o "Anjo" de Ceschiatti e, na porta do plenário, a estátua de Ulisses Guimarães, deputado por 10 legislaturas e figura importante durante a transição de poder dos militares e a Constituinte. Diante da escultura do anjo me veio um pensamento: O "Anjo" de Ceschiatti foi feito de bronze, mas os homens são feitos de ambição!
Mas, sigamos em nosso passeio.
A concha da direita, da minha perspectiva, temos o Senado Federal (A concha emborcada). Imaginei, por dentro, o salão azul, com seus gabinetes de vidros escuros, corredores com luzes escondidas de iluminação indireta, intimista, corredores belos que levam às salas das Comissões ou ao Plenário, lugar onde se realizam as decisões dos senhores Senadores da República. Beleza arquitetônica igual àquela abóbada eu nunca vi outra igual.
Estando ainda em pé na Praça, virei meus olhos para ver a escultura, do artista Bruno Giorgi, conhecida como "Os Candangos", cujo nome original eria "Os Guerreiros". Atrás dele, visualizei o Palácio do Planalto, o local de trabalho do Senhor Presidente da República, chefe do Poder Executivo da República do Brasil.
Virando quarenta e cinco graus à esquerda, temos o Pavilhão Nacional e logo em seguida o Panteão da Pátria e da Liberdade, obra do arquiteto Oscar Niemeyer, onde funciona um memorial cívico destinado a homenagear os heróis e heroínas nacionais.
Mais uma volta à esquerda, vemos o edifício-sede do Supremo Tribunal Federal, cúpula do Poder Judiciário brasileiro.
Então, comecei a pensar comigo que, ao contemplar tanto luxo, beleza e leveza nas linhas arquitetônicas de Brasília, como poderia, naquele momento, eu estar envolto a tanto sentimento adverso, um sentimento ruim vendo toda aquela beleza.
Da Praça dos Três Poderes, com a minha mente, eu também consegui visualizar os mais variados rincões, riquezas e pobrezas do meu país. As cidades com todos os seus problemas que parecem não ter fim, a falta de saneamento, as desigualdades de toda ordem, problemas urbanos, urbanísticos, rurais, sanitários, a falta de saúde, de educação e segurança. Que contraste! Quanta beleza, quanta tristeza, dois pêndulos de um pensamento.
Então, comecei a pensar que, nos dias do Brasil de hoje, nessa Praça dos Três Poderes, talvez pudesse ser ouvida a voz destemida de Sócrates, cujo ética baseada na virtude dos homens, pudesse desbancar de seu poderio os aristocratas de plantão, que se servem das tribunas e dos tribunais, dos palácios e de seus bajuladores, que avocam para si a prerrogativa da não submissão ao princípio da legalidade, isonomia, da lisura e da vergonha. Ó vergonha, onde estás, tu não existe mais!
Hesitei, porém, em meus pensamentos e novamente me veio um sentimento negativo.
Como nós, os pobres mortais, por certo, o filósofo da ética seria, mais uma vez, em todas as Cortes e Plenários, condenado a beber novamente da cicuta, porque a sua ética, centrada no homem, e não em mitos (poder, vaidades) e "divindades" (dinheiro, poder corrupção) contrariaria, por certo, os interesses de uma elite política que está a serviço da concentração da riqueza, em detrimento de milhões de brasileiros que têm que se contentar com uma mísera esmola chamada bolsa-família, ou ao silêncio da covardia.
Esses mesmos ladrões e corruptos que de manhã, nas missas, frequentam as filas das comunhões nas catedrais, à noite banqueteiam com lobistas que compram seus votos no parlamento e nos tribunais, em troca da garantia de novos financiamentos para suas eternas reeleições.
Desiludido, decidi terminar meu passeio pela Praça dos Três Poderes e voltar pra casa, procurar algum livro pra ler e tentar desanuviar meus pensamentos que estavam tão negativos.