A ESPECTADORA
Da janela da minha sala, em uma casa linda tombada pelo patrimônio histórico, vejo algumas árvores - Pata-de-vaca (Bauhinia forticata) - com algumas poucas flores brancas a secar.
Sempre que tenho tempo abro a porta de uma varandinha que tenho e fico a observar o balanço da copa das árvores, um vai e vem silencioso quase que constante, tão constante quanto o trânsito dessa caótica cidade.
Carros com pressa, buzinas irritadas e irritantes - que, na maioria das vezes, atrapalha meu atendimento. Pessoas correndo, chegando, entrando, saindo, indo. Janelas se abrindo, fechando. E, da varanda, eu só olhando. "Admirando" essa loucura que é sobreviver.
Quando paro assim, viajo nas situaçãoes, sinto que a tal luta diária por sobrevivência desaparece minutalmente e me entrego ao prazer do canto dos pássaros, do céu nublado clareando, do cheiro de asfalto molhado, do casal que caminha lado a lado.
Cheguei da varanda hoje cedo e o que vi foi um beija-flor, na verdade um beijinho-de-flor de tão pequenino. Namorava uma das flores da árvore que me refresca nos dias de calor intenso. Ele pousava seu delicado bico nela, tão doce era, beijava e beijava.
Depois de muito namoro pousou tranquilo no galho da árvore vizinha e fez o que faço: observou a avenida barulhenta, em silêncio, todo calmo.
Dei um sorriso pretencioso e pensei, em pensamento baixo: estaria esse beijinho de gente, digo de flor, imitando a atitude minha?
Ah! Como eu queria também voar, depois pousar tranquila e leve... repousar silêncio num galho de árvore qualquer e não me sentir uma qualquer nesse turbilhão urbano.