BURRO MECÃNICO

O Mundico, um amigo meu, foi fazer uma pequena viagem de carro ao interior mineiro, objetivando visitar parentes no norte do estado. Acondicionou matalotagem no porta-malas do seu valente “Fusca” e partiu.

O carrinho era velho mas robusto, bom de pneus e disposto aos desafios da estrada. Engolia as distâncias, vencendo os quilômetros que teria de percorrer com galhardia. A paisagem bucólica passava rápido pelas janelas, ora mostrando gado pastando, ora trabalhadores no canavial.

A manhã acabou-se, o sol esquentou e nosso amigo resolveu parar num vilarejo pra refrescar a garganta, fazer um xixi e dar uma esticada nas pernas.

Entrou à direita no primeiro entroncamento, pegou uma estradinha de terra e foi em frente. Passou por uma fazendola, cortou um pasto verdejante, atravessou um mata-burro e estancou diante duma porteira velha pintada com o nome “CASAS PERNAMBUCANAS” em branco.

Desligou o carro, abriu a porteira, voltou ao veículo, deu a partida e ... o “Fusca” não pegou. Tentou de novo e nada!

Mundico ficou nervoso, desceu, abriu a tampa do motor, checou o distribuidor, os cabos de vela, a bobina. Retornou ao volante, ligou de novo mas o diabo do motor não pegou.

Ele tornou a mexer no motor, coçou a cabeça, num gesto impaciente e aí, então, ouviu uma voz meio grave dizer:-

“- O defeito tá no carburador ...”

Mundico olhou em torno e não enxergou vivalma. Só um burro pastava ali por perto. Mais nada.

O homem tornou a mexer no carro e, de novo, a mesma voz repete a incrível mensagem:-

“- O defeito tá no carburador, sujeito!...”

O motorista girou rápido o pescoço e ainda viu o burro balançando a cabeçorra, arreganhando os beiços e mostrando os dentes.

Quase teve um ataque, mas refez-se e foi agora direto ao carburador do possante. Percebeu então que ele estava frouxo, quase solto.

O homem fez uso das ferramentas, ajustou a peça, apertou os parafusos, foi à chave de ignição, girou ... e o motor pegou bonito, roncando alto, botando fumarada pelo escape e espantando os passarinhos do arvoredo próximo.

O viajante limpou as mãos numa estopa, sorridente, tomou assento e prosseguiu viagem, alcançando breve a praça empoeirada duma vila chamada “Pontinha”.

Estacionou o “Fusca” sob uma barriguda florida, dirigiu-se à birosca defronte. Meia dúzia de capiaus proseava e bebericava no interior da vendinha.

O forasteiro pediu uma “cachaça da roça”, um pedação de torresmo e foi servido com presteza pelo dono do boteco. Aí, depois do trago, ele virou-se para o vendeiro, indagando:-

“- Escuta, amigo! Você acha que eu tenho cara de doido? Eu pareço doido?...” O vendeiro mirou-o de alto a baixo e disse:-

“- Não, o senhor não me parece doido. Mas por que me pergunta isso?”

Mundico então contou-lhe, com detalhes, o que lhe acabara de acontecer perto dali, insistindo no fato de que teria ouvido o burro falar:- “- O defeito tá no carburador!”

O dono da birosca franziu a testa e perguntou ao meu amigo viajante:-

“- E que cor tinha esse burro?...

“- Ah, era preto. Isso, um burro preto!”, falou Mundico.

“- Ainda bem, meu amigo. Você teve muita sorte, pois tem um burro branco por aí que não entende nada de mecânica!...”

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RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 24/09/2009
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