Romanticismo às avessas
Barzinho. Música ao vivo. Som dançante. Gente bonita. Ambiente propício para uma paquera.
O garçom aproxima-se da moça e entrega-lhe um pequeno bilhete.
- Oi, meu nome é Rony. Gostei de você. Meu celular é 99999999.
A moça, então, disca o número dado, manifestando a resposta, em sinal positivo.
O moço responde. A moça sorri. Ele a encara. Ela disfarça.
O sujeito liga para ela e diz:
- Quero te dar um beijo...
A mulher jovem titubeante, arrisca:
- Beijo !? Mas, eu nem o conheço, apenas sei o seu nome... !?
- E daí? Como faço para beijá-la?, insiste o rapaz.
- Eu não sou assim, moço! Não saio beijando qualquer um assim...
- Ah...! Entendo. Então deixa... , responde o macho todo sem jeito.
A garota, perplexa, fica emudecida. Estática por alguns segundos como num estado de choque.
Então, vira-se para a amiga e comenta o ocorrido. Esta, por sua vez, a condena por não ter aceitado o convite do beijo.
- Mas aonde é que nós estamos !?, replica a moça atônita. – Qual é a bomba de efeito moral lançada agora? Não se paquera mais? Não há conquista? Não se manda flores? Não se faz declaração de amor? Não se pede em namoro? Noivado? Casamento?
- Não, a moda agora é essa, retruca a amiga ironicamente. É pegar ou largar. É só sair beijando e pronto. Se não gostar do beijo, é fácil, beija outro e mais outro e ...
- Chega! Não sou de modismos... sou romântica, entende!? Gosto de ser conquistada, surpreendida, gosto de beijos roubados, passeios no parque, sessão de cinema, música lenta, dançar coladinho, namorar no portão, encontros na pracinha, cartas de amor, Drummond...
Aproxima-se uma moça, discretamente, e lhe diz assim:
- Você é solteira? Pergunto porque tem um amigo meu lá atrás que está interessado em você. Quer conhecê-lo? Vamos lá, não lhe custa. É rápido.
- Está bem, responde acuada, a moça.
- Olá, como vai. O meu nome é Carlos. Você vem sempre aqui? – O que você faz?, pergunta-lhe o rapaz, ansiosamente.
- Não, é a primeira vez que visito esse local. Achei bem interessante. Sou estudante, responde a garota.
- Interessante, diz o rapaz. – Vem sentar-se com a gente, convida o moço.
- Eu já estou indo embora, afirma a jovem mulher. Tem celular? Eu te ligo, diz enfadada.
Antes de sair do bar, elas param na pista de dança para observar o conjunto musical e, eis que o inesperado acontece. O rapaz que enviou o bilhete passa pela garota e tasca-lhe um beijo, na face, mas com estalo profundo e diz bye-bye.
A moça envergonhada pelo beijo roubado, vai embora entristecida, diante do comportamento do rapaz.
No dia seguinte encontra a amiga e juntas combinam novo passeio.
A amiga confessa, então, que o rapaz ‘do beijo’ foi até a mesa delas, na noite anterior, e disse que o bilhete era para ela e não para a mulher jovem.
Agora o que era doce se acabou.
É certo que de romântico o sujeito não tinha mesmo nada, mas paquerar a amiga e mandar bilhete para ela... isso já era demais!
Foi embora para casa, trancou-se em seu quarto e passou a recitar, em alta voz, desenfreadamente:
- “... TiNha uMa PeDra no mEio do CaMinHo... “, Drummond!
- “Perdi o bonde e a esperança. Volto pálido para casa...”