A VELHINHA DROGADA
Foi assim que meus olhos enxergaram Maradona e seu angustiado olhar desamparado no último jogo do Brasil contra a Argentina, quando a nossa seleção canarinha venceu o avoado e fraco time portenho por 3x1. Ele se mostrava completamente perdido e alheio a tudo que ali se passava ante seus olhos mortiços e acabrunhados, após o segundo gol do Brasil. Desvairado e sem encontrar nenhuma saída para a derrota que se desenhava em campo, seus jogadores procurando fazer o possível e o impossível para não perder vergonhosamente a partida, até mesmo buscando a violência, Maradona roía ávidamente as unhas indiferente ao olhar das câmeras que o exibiam em toda força da melancolia extrema, visivelmente amargurado e entregue àquela tristeza profunda somente percebida nos que já não se importam mais quando o mundo está desabando sobre sua cabeça. Provavelmente também se corroendo em seu recôndito, tentando não chorar mas o rosto demonstrando total angústia, absoluta insegurança. Creio que Maradona, naquele momento, chorava por dentro.
Quando o jogo finalmente terminou, para nossa alegria expressa em gritos e foguetões Brasil afora, e irremediável tortura para o time argentino cabisbaixo, víamos um Maradona acabado, em farrapos e desprovido do mais ínfimo resquício de orgulho. Penso que ele saiu de campo sem saber onde se encontrava nem para onde ia, como um robô quebrado, um brinquedo de corda defeituoso ainda claudicando para dar alguns passos mas prestes a desmoronar a qualquer momento. Havia lágrimas secas por todo seu rosto, fragmentos mortos de arrogância derretendo na comissura de seus lábios e tornando-se uma baba asquerosa na boca contraída e humilhada. O técnico pretensioso que escolhera com régua e compasso o campo argentino, um espaço totalmente azul e branco e cheio de torcedores mordazes e ferrenhos para tentar abater o time brasileiro, agora amargando uma senhora derrota, abatido de maneira vergonhosa no átrio de sua terra, sob o olhar perplexo dos seus conterrâneos, caminhava no pântano da mais explícita humilhação no rumo do pesadelo mais cruel. O time argentino perder para o Brasil já é algo capaz de fazer qualquer torcedor portenho botar o rabo entre as pernas e procurar um lugar para se enterrar, mas, para nuestros hermanos, ver seu querido time derrotado por jogadores brasileiros em solo argentino ante a gritaria e os impropérios dos donos da casa e ainda mais por 3x1 é por demais insuportável.
Quando, três dias depois, cheguei a Buenos Aires a primeira frase que o motorista do nosso traslado falou, sabendo que somos brasileiros e felizes, foi: " nada de falar de futebol, melhor não". Nos noticiários da TV local os gols do Brasil eram mostrados de vez em quando enquanto comentaristas esportivos argentinos tentavam engolir e explicar a derrota por eles sofrida no próprio sacrossanto chão de seus país. Dias depois, através desses mesmos noticiários, eu soube que Maradona, com aquele aspecto tristonho de velhinha drogada que pinta o cabelo de preto, estava se cuidando num spa cuja diária custava a bagatela de quatro mil pesos.