Cortinas Vermelhas
O sol esquentava meu rosto, a cabeça doía, ainda mal tinha acordado.
Sequer lembrava-me o que tinha acontecido nas últimas doze horas. Assim meio sem memória, comecei a abrir os olhos.
Teto branco, lustre amarelo, cortinas vermelhas, mobília nova, moderna, quarto amplo.
Jamais havia estado naquele lugar, disto tinha certeza. Pela janela, nenhum edifício, apenas arvores e o azul do céu. Ouvia um ruído distante, indicando a proximidade de alguma rodovia.
Certamente estou em um hotel nos arredores da cidade. Como vim parar aqui?
Susto, dei-me conta que não estava só. Sim alguém dormia ao meu lado. O certo é que no silencio do quarto, podia sentir sua respiração...ao menos estava viva, há poucos centímetros de mim, corpo coberto pelo lençol, dormia profundamente.
Tinha que fazer alguma coisa rapidamente para descobrir quem era ela.
Sem movimentar meu corpo, investiguei o ambiente do quarto, atrás de alguma pista.
Sua roupa delicadamente repousando sobre o braço do sofá. Tons vermelhos e pretos, provavelmente alguém de meia-idade. Mas quem?
Tentei lembrar-me do que aconteceu... a viagem, a convenção, o jantar, a esticada, musica, muita bebida, amigos... amigas. Estava tão escuro. Quem será ela?
Poderia ser a Ana, a Beatriz, ou a Camila, não, não, a Camila é casada... ou nenhuma delas.
Pior, ela está se mexendo. Talvez acordando... Então pronto: decidi brincar de gato e rato. Cobri minha cabeça e me fingi de morto.
Aquilo deu certo, ela se levantou e abriu o que parecia ser sua bolsa, buscando alguma coisa lá dentro... fazia muito barulho, o que ela estaria procurando?
Por um instante pensei, seria uma arma? Porém, fiquei firme. Era um celular, agora sim, a reconheceria pela voz.
Pena, a ligação não foi completada. Jogou-o na bolsa e caminhou para o banheiro.
Percebi quando ligou o chuveiro... era minha chance. Saltei da cama e vasculhei sua bolsa atrás de uma foto, de um nome, de uma história.
Objetos de uso pessoal, chaves, algumas moedas, papéis que não me atrevi a ler e um documento de identidade.
Ah... foto antiga, Valéria, do interior do Paraná. O que estaria fazendo na Capital? Talvez trabalhe por aqui.
Por alguns minutos fiquei olhando o rosto da foto, procurando algum traço que fizesse sentido. Seu olhar, sim, o mesmo olhar da noite anterior a mesma roupa... o mesmo rosto... mais maduro, sofrido.
Sem demora fechei a bolsa, ela havia desligado o chuveiro.
O que fazer? Voltei para a cama e permaneci escondido. Aquela atitude já me incomodava tremendamente, era uma atitude ridícula e infantilizada.
Há qualquer momento ela voltaria ao quarto. Ainda assim, permaneci imóvel.
Ela voltou, caminhou pelo quarto, foi até a janela, manteve-se lá por alguns instantes. Depois voltou à bolsa, ouvia-a falar ao celular, procurando alguém, desligou nervosa...
Mais um telefonema e pediu um rádio taxi... quinze minutos. Eu não tinha mais tempo, fiz um movimento suave, me despi do lençol e fitei-a.
Assustada, cobriu o corpo e olhou-me... como se eu fosse um ET. Minha aparência deveria estar horrível.
Não encontrei nada melhor do que um...
- Oi !
Embora o constrangimento fosse inevitável, havia no ar um tom hilário e desconcertante na situação que nos salvava do desastre total.
Ao pé da cama conversamos por um tempo. Falamos sobre quem éramos, o que fazíamos na cidade, estas coisas...
Nenhuma menção sobre nosso encontro de ontem. Como se nós dois tivéssemos feito um pacto secreto para não tocar no assunto.
Enquanto fui ao banheiro, ela vestiu-se. Ela manteve o taxi e eu mantive-me de cueca. Enfim nos despedimos com um abraço e eu a conduzi até a porta do quarto.
Após fechá-la, voltei para cama, no caminho ficou seu perfume, amadeirado.
Pensei em como às vezes se mostra frágil nossa condição humana. O quarto, a cama, as cortinas, componentes de um cenário, cujo roteiro da peça era desconhecido, um mistério...
Como chegamos aqui? O que vivemos naquelas horas? Tantas perguntas, poucas respostas.
Horas mais tarde, ao deixar o quarto, recolhendo minhas coisas, encontrei debaixo do celular, um bilhete.
“Me ligue mais tarde, quero vê-lo novamente”
Um número de telefone e um nome... Valéria.
Selado com um beijo vermelho, vermelho da cor das cortinas do quarto.
A vida estava nos dando uma segunda chance...
O sol esquentava meu rosto, a cabeça doía, ainda mal tinha acordado.
Sequer lembrava-me o que tinha acontecido nas últimas doze horas. Assim meio sem memória, comecei a abrir os olhos.
Teto branco, lustre amarelo, cortinas vermelhas, mobília nova, moderna, quarto amplo.
Jamais havia estado naquele lugar, disto tinha certeza. Pela janela, nenhum edifício, apenas arvores e o azul do céu. Ouvia um ruído distante, indicando a proximidade de alguma rodovia.
Certamente estou em um hotel nos arredores da cidade. Como vim parar aqui?
Susto, dei-me conta que não estava só. Sim alguém dormia ao meu lado. O certo é que no silencio do quarto, podia sentir sua respiração...ao menos estava viva, há poucos centímetros de mim, corpo coberto pelo lençol, dormia profundamente.
Tinha que fazer alguma coisa rapidamente para descobrir quem era ela.
Sem movimentar meu corpo, investiguei o ambiente do quarto, atrás de alguma pista.
Sua roupa delicadamente repousando sobre o braço do sofá. Tons vermelhos e pretos, provavelmente alguém de meia-idade. Mas quem?
Tentei lembrar-me do que aconteceu... a viagem, a convenção, o jantar, a esticada, musica, muita bebida, amigos... amigas. Estava tão escuro. Quem será ela?
Poderia ser a Ana, a Beatriz, ou a Camila, não, não, a Camila é casada... ou nenhuma delas.
Pior, ela está se mexendo. Talvez acordando... Então pronto: decidi brincar de gato e rato. Cobri minha cabeça e me fingi de morto.
Aquilo deu certo, ela se levantou e abriu o que parecia ser sua bolsa, buscando alguma coisa lá dentro... fazia muito barulho, o que ela estaria procurando?
Por um instante pensei, seria uma arma? Porém, fiquei firme. Era um celular, agora sim, a reconheceria pela voz.
Pena, a ligação não foi completada. Jogou-o na bolsa e caminhou para o banheiro.
Percebi quando ligou o chuveiro... era minha chance. Saltei da cama e vasculhei sua bolsa atrás de uma foto, de um nome, de uma história.
Objetos de uso pessoal, chaves, algumas moedas, papéis que não me atrevi a ler e um documento de identidade.
Ah... foto antiga, Valéria, do interior do Paraná. O que estaria fazendo na Capital? Talvez trabalhe por aqui.
Por alguns minutos fiquei olhando o rosto da foto, procurando algum traço que fizesse sentido. Seu olhar, sim, o mesmo olhar da noite anterior a mesma roupa... o mesmo rosto... mais maduro, sofrido.
Sem demora fechei a bolsa, ela havia desligado o chuveiro.
O que fazer? Voltei para a cama e permaneci escondido. Aquela atitude já me incomodava tremendamente, era uma atitude ridícula e infantilizada.
Há qualquer momento ela voltaria ao quarto. Ainda assim, permaneci imóvel.
Ela voltou, caminhou pelo quarto, foi até a janela, manteve-se lá por alguns instantes. Depois voltou à bolsa, ouvia-a falar ao celular, procurando alguém, desligou nervosa...
Mais um telefonema e pediu um rádio taxi... quinze minutos. Eu não tinha mais tempo, fiz um movimento suave, me despi do lençol e fitei-a.
Assustada, cobriu o corpo e olhou-me... como se eu fosse um ET. Minha aparência deveria estar horrível.
Não encontrei nada melhor do que um...
- Oi !
Embora o constrangimento fosse inevitável, havia no ar um tom hilário e desconcertante na situação que nos salvava do desastre total.
Ao pé da cama conversamos por um tempo. Falamos sobre quem éramos, o que fazíamos na cidade, estas coisas...
Nenhuma menção sobre nosso encontro de ontem. Como se nós dois tivéssemos feito um pacto secreto para não tocar no assunto.
Enquanto fui ao banheiro, ela vestiu-se. Ela manteve o taxi e eu mantive-me de cueca. Enfim nos despedimos com um abraço e eu a conduzi até a porta do quarto.
Após fechá-la, voltei para cama, no caminho ficou seu perfume, amadeirado.
Pensei em como às vezes se mostra frágil nossa condição humana. O quarto, a cama, as cortinas, componentes de um cenário, cujo roteiro da peça era desconhecido, um mistério...
Como chegamos aqui? O que vivemos naquelas horas? Tantas perguntas, poucas respostas.
Horas mais tarde, ao deixar o quarto, recolhendo minhas coisas, encontrei debaixo do celular, um bilhete.
“Me ligue mais tarde, quero vê-lo novamente”
Um número de telefone e um nome... Valéria.
Selado com um beijo vermelho, vermelho da cor das cortinas do quarto.
A vida estava nos dando uma segunda chance...