MARY LOU ….

 

     Uma das coisas que mais gosto de fazer e ficar na minha sala, sentado no meu sofá preferido bem relaxado e só com a luz do abajur acesa.

    Aproveito esses momentos para escutar as músicas da minha preferência e nessas horas o pensamento viaja, me levando aos campos mais remotos da minha vida, incluindo-se aí a infância e a adolescência.

   E assim do nada, me veio a mente a lembrança da primeira pessoa que considerei realmente como amiga. Era uma menina, uma linda, terrivelmente sapeca e risonha menina que se chamava Mary Lou da Silva.

   Sempre tive uma enorme curiosidade em saber de onde os pais descobriram esse nome, digamos , tão exótico , pois não me lembro de ter ouvido falar de nenhuma princesa, artista de cinema, rainha ou marca de biscoito com o nome de Mary Lou.

   Nos éramos colegas desde o primeiro ano do grupo escolar, além de sermos vizinhos. Chegamos a brincar juntos, jogar bola, bolinha de gude, soltamos pipas e ficamos tão amigos que inclusive fomos par constante nas festas caipiras da rua em que morávamos.

   E o mais interessante é que nunca fomos o que se diz , namorados, éramos amigos, grandes amigos ou melhor, não éramos só amigos.

   Éramos também parceiros de farras e traquinagens. Mary Lou era uma verdadeira moleca, ria de qualquer coisa e estava sempre disposta a aprontar uma boa peça.

    Certa vez , não sei como, conseguiu levar para a sala de aula uma rã, dessas que não sabem fazer outra coisa a não ser ficar saltando de um lado para o outro.

    Não é difícil imaginar a confusão gerada na classe quando descobriram que a rãzinha estava no banco de uma das garotas, justamente a mais escandalosa.

   Mary Lou era parceira na divisão da merenda e até certa vez discutiu com outro garoto que queria arrumar uma briga comigo. Mas jamais, nem eu nem ela , admitimos que éramos namorados . Éramos só amigos e pronto. Nada além disso.

   Ficamos juntos por todo o curso primário e me lembro bem da primeira vez que outro garoto a convidou para ir a matinê do domingo. Ela, meio sem graça me perguntou se deveria aceitar ou não e eu me lembro de ter dito que deveria aceitar sim, desde que me levasse também.

   É provável que ali, naquele momento eu começasse a ter contato com o tal do ciúme, não aquele ciúme doentio mas aquele que incomoda, que começa com uma dorzinha fina no estômago e sobe até ao coração.

   Mary Lou era linda. Tinha um sorriso encantador e grandes olhos negros. Usava cabelos curtos, bem curtos e alegava que eram mais fáceis de pentear, pois bastava balançar a cabeça.

    Mas, como não há sempre um mas ,e nem bem que sempre dure e mal que nunca se acabe, um dia tivemos que nos separar.

   A família dela se mudou para outro bairro e em consequência, também houve a transferência para outra escola .

   Gostávamos tanto um do outro que preferimos não nos despedirmos. Nós, na inocência da nossa infância, achávamos que nos encontraríamos novamente e para tanto, bastaria olhar para o céu a noite e fazer um pedido para uma estrela que estivesse caindo, e logo seriamos atendidos.

   Quanta inocência ! A verdade é que depois que Mary Lou se mudou, conheci outro dos espinhos que acompanham nossas vidas, que foi a saudade.

   Nunca tinha sentido saudade de ninguém e Mary Lou foi a primeira pessoa que me fez derramar uma lágrima com a desculpa de estar sentindo saudades.

   Passaram-se muitos anos, eu me mudei de cidade , me casei e nunca mais ouvi falar de Mary Lou.

   Imagino que deva estar casada, talvez com um ou dois netos e deve conservar até hoje sua alegria natural, seu riso fácil e lindo e, quem sabe um pouco das suas traquinagens.

   A   vida  nos   apresenta situações interessantes. Certas pessoas entram no nosso caminho, nas nossas vidas e permanecem por algum tempo e vão embora. Deixam uma grande saudade no inicio, profundas marcas no coração e por uns tempos são esquecidas.

   Mas, basta que aconteça o clima exato, ou a música apropriada ou ainda, como no meu caso, uma casa silenciosa, altas horas da madrugada, um sofá macio, uma música agradável e uma luz suave para trazer para o presente as melhores lembranças de um passado distante.

   Suspirei fundo, desliguei o som, a luz do abajur e fui dormir. Nem me lembro se sonhei com a Mary Lou . Provavelmente, devo ter sonhado.......

 


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(.....imagem google.....)

WRAMOS
Enviado por WRAMOS em 20/09/2009
Reeditado em 19/02/2013
Código do texto: T1820627
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