Mala velha...
Águida Hettwer
No final da Rua Salgado Aranha, as ferrugens do portão denunciavam o abandono. Imóvel adquirido com sacrifício e esforço pelo avô João. Agora era de sua propriedade. Nem disfarçava a ansiedade, pois o casarão em seu interior, guardava recordações de sua infância.
Ainda ressoam vozes, risos e histórias contadas entre os cômodos da antiga casa. Memória aguçada tinha o ancião de cabelos prateados. Lembrara da riqueza de detalhes, as letras deitadas no papel amarelado, sob a mira da tênue luz que vinha do escritório, onde o avô passava maior parte do tempo.
Uma velha mala no fundo do armário, como se guardasse segredos em seu zíper. Lenços, cartas, pequenos mimos e um caderno de capa de couro, onde o tempo foi zeloso com ele. Nas páginas do diário, emoções descritas ali, em conta gotas. Anotações provavelmente escritas pela avó Adélia, antes da doença lhe consumir a alegria, onde deixara praticamente cega.
Descrevia de como se sentia feliz aos cuidados do João, pelo carinho e atenção que sempre lhe prestara. Quando lhe ajudava a atravessar a rua, segurava firmemente sua mão. As advertências para tomar a medicação em horários certos. E a paciência com que tratava o jardim, cultuando as flores das quais mais gostava.
Certamente Adélia sabia que seus dias estavam contados, e preparava com cuidado sua partida. Sofria em silêncio compartilhado, apenas com as letras. Nada mais lhe restara de importante nos últimos tempos, a não ser contemplar a face de João enquanto adormecia.
Agora entendera o porquê do avô João, passar tantas horas dedicadas à leitura.
Escrito no prefácio do diário;
João, meu eterno amor, eu sempre te amarei!
-Com amor e carinho...
Adélia.
Em uma manhã de setembro de 1965.
19.09.2009
Águida Hettwer
No final da Rua Salgado Aranha, as ferrugens do portão denunciavam o abandono. Imóvel adquirido com sacrifício e esforço pelo avô João. Agora era de sua propriedade. Nem disfarçava a ansiedade, pois o casarão em seu interior, guardava recordações de sua infância.
Ainda ressoam vozes, risos e histórias contadas entre os cômodos da antiga casa. Memória aguçada tinha o ancião de cabelos prateados. Lembrara da riqueza de detalhes, as letras deitadas no papel amarelado, sob a mira da tênue luz que vinha do escritório, onde o avô passava maior parte do tempo.
Uma velha mala no fundo do armário, como se guardasse segredos em seu zíper. Lenços, cartas, pequenos mimos e um caderno de capa de couro, onde o tempo foi zeloso com ele. Nas páginas do diário, emoções descritas ali, em conta gotas. Anotações provavelmente escritas pela avó Adélia, antes da doença lhe consumir a alegria, onde deixara praticamente cega.
Descrevia de como se sentia feliz aos cuidados do João, pelo carinho e atenção que sempre lhe prestara. Quando lhe ajudava a atravessar a rua, segurava firmemente sua mão. As advertências para tomar a medicação em horários certos. E a paciência com que tratava o jardim, cultuando as flores das quais mais gostava.
Certamente Adélia sabia que seus dias estavam contados, e preparava com cuidado sua partida. Sofria em silêncio compartilhado, apenas com as letras. Nada mais lhe restara de importante nos últimos tempos, a não ser contemplar a face de João enquanto adormecia.
Agora entendera o porquê do avô João, passar tantas horas dedicadas à leitura.
Escrito no prefácio do diário;
João, meu eterno amor, eu sempre te amarei!
-Com amor e carinho...
Adélia.
Em uma manhã de setembro de 1965.
19.09.2009