G
irassóis interiores
 
     Não os tenho ao alcance da visão, mas insurgem no jardim imaginário do meu ilusório.
         Amarelos, degradantemente amarelos, eloquentemente e em quantidades variáveis, nos vasos ou cortados, um delírio visual precioso e necessário para o alegrar. Qual o Sol. Girassóis infligem a regra da delicadeza de um jardim, abundando em tamanho, exuberando na cor, são convidativos, plenos, intensos, chegam a parecer ter sabor.
Sabor de tarde ensolarada e ventilada bem na frente da baia do Guajará.
 
         A ideia do artista, a febre que o tomou pouco antes do trágico fim, deixa-nos inúmeras mensagens, aliás, cada obra o retrato de uma fase da vida, mas os Girassóis, que foram pintados no anteceder do agravamento das doenças psíquicas revelam um apelo, uma tentativa talvez de ousar retirar-se da loucura.



                

         Os Girassóis cortados, em número de quatro telas, em especial a tela
Os Quatro Girassóis cortados que datam de 1887, ganham mais clareza, quando a obra do artista sai definitivamente dos tons obscuros. E daí para frente predomina cores, em especial o amarelo, que para uns denunciava um mal e/ou uso excessivo de Absinto (Fada Verde) que o fazia ver tudo em amarelo (xantopsia), e para outros uma instantânea intenção de alegrar, de se alegrar, na eminência do agravamento da doença que por ele era completamente conhecida. Da qual tinha consciência. Um rol de prováveis razões.
          A chamada época da explosão de cor antecedeu um momento de muita doença, internações e o intensificar do quadro de depressão que culminou com o fim trágico que deu a sua vida. Um tiro no peito e os dois últimos dias agonizando nos braços de Theo (irmão), para quem dirigiu as famosas últimas palavras
A TRISTEZA DURARÁ PARA SEMPRE”.

                     

         Entre tantos artistas consagrados, este é um dos que me envolve deveras, cuja história me faz refletir sobre a breve e marcante trajetória na arte e na vida, remetendo ao mais íntimo que posso me observar. O quanto de loucura e lucidez cabe em um ser humano. Como conciliar as exasperações, indignações, decepções, frustrações sem que isso nos cause danos irrecuperáveis, lesando em especial a nossa dignidade e acuidade.
         Penso no que conduz a um evento psíquico complexo, em pessoas que antes deram exemplo de lucidez, coerência e mais ainda, pessoas tão imensuravelmente geniais. Inominável saber e agir.
         Ouso acreditar que mister se faz ter atenção redobrada as pequenas e sutis mudanças que ocorrem no decorrer da vida, enquanto a consciência nos permite alguma ação para mudá-las. Tomar sempre consciência das limitações, observar mais as pessoas introspectivas, fechadas, que pouco ou nada se expressam tentando achar nelas um veio de expressão, canal de entendimento. A arte é sempre um sinal.
 
          Sou fã da espécie (planta), mas em destaque sou aficionada pelos Girassóis de Van Gogh, não só o belo da obra, arte em si, mas pelo que eles retratam, como se fizeram tão símbolos de uma passagem importante do artista, e mais, tradutores dos sentimentos mais belos que ele vivia como a vontade se ser imensamente feliz.



                

         Nada como retratar o Sol.
         O grande símbolo do combate à depressão. O sol, seu alegrar, sua força e energia. O Girassol, a natureza tão perfeita se permitindo imitar, reproduzir... Criou uma Flor que expressa o Sol, seus raios, cores, e ainda o acompanha do nascer ao arrebol. Isso é belo por demais. Significativo.
 
         Gira que gira a vida. Que girem e luzam os Girassóis.
 
         Essencial, é mesmo ser feliz.


 
                     

Adendo:
 
Das Obras:
 
 
Dois girassóis cortados (três obras) e Quatro Girassóis cortados, todas de 1887. – quatro obras.
 
Vasos com Cinco Girassóis, vaso com Quinze Girassóis (três obras), Vaso com Doze Girassóis (a mais conhecida) duas obras e vaso com três Girassóis. (1888 a 1889)
 
Um total de 11 (onze) trabalhos com o mesmo motivo.


                          
 



Algumas citações do Artista:
 

 
Em cartas para Theo,
 
“Pinto com prazer de um marselhês comendo uma bouillabaisse, o que não o surpreenderá sabendo que pinto girassóis”...
 
 
"Você pode saber que a peônia é de Jeannin, a malva-rosa pertence Quost, mas o girassol é minha de um jeito." Janeiro 1889.
 
 

Outras cartas:
 
“Eu sinto o desejo de renovar a mim mesmo, e para tentar se desculpar pelo fato de que meus quadros são, afinal, quase um grito de angústia, apesar de o girassol rústico que pode simbolizar a gratidão.” Fevereiro 1890.
 
 
Outras:
 
"Após a experiência dos ataques repetidos, convém-me a humildade. Assim pois: paciência. Sofrer sem se queixar é a única lição que se deve aprender nesta vida."


 

                          
 
Vincent van Gogh – 1853 a 1890
 
 


           
 
Roseane Namastê
Enviado por Roseane Namastê em 18/09/2009
Reeditado em 15/05/2015
Código do texto: T1817867
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