Pai e Filho separados por questões sociais
João estava ansioso, finalmente, no fim de semana iria visitar seu filho Juca de quem estava com muitas saudades. João e Edwiges eram separados porque o amor acabara, embora as más línguas de alguns vizinhos dissessem que Edwiges se cansara da pobreza. É que a alguns anos, se não me engano, a vinte anos, Edwiges apaixonara-se perdidamente por um rapaz de poucas posses que não agradava nem um pouco aos pais da moça. Os amigos diziam que era fogo de palha, que Edwiges queria viver uma história de novela. Os pais lhe arranjavam pretendentes de bom nome e muito ricos, porém, Edwiges cismara com João. Foi um período de brigas, de muitas mágoas, até que a mãe da moça decidira apoiar o noivado com medo de que a filha querida fugisse. E dizia aliviada que pelo menos, João tinha caráter e trabalhava, não era nenhum bêbado. O pai de início relutou, mas acabou concordando com a esposa, pois tinha certeza que o casamento não iria durar muito tempo. Aliás, ele não apostaria nem em um mês. Logo a filha iria voltar para casa com saudades dos seus confortos de menina mimada, algo que jamais teria com João, a não ser que ele ganhasse na loteria. Na verdade o pai da moça enganou-se, o casório durou mais de um mês, mesmo a moça sentindo falta do luxo e conforto. O amor deles parecia coisa de cinema, viveram um quase conto de fadas. Disse "quase". Quando Juca nasceu, apesar da alegria pela chegada da criança, as dificuldades aumentaram. Para piorar, Jõao fora despedido da oficina em que trabalhava, já que seu chefe tinha umas dívidas e não poderia mais pagar o seu salário, que, diga-se de passagem, já era uma "ninharia". O tempo ia passando e as dificuldades aumentando: João não conseguia um novo emprego e Edwiges tinha que ficar em casa cuidando do filho. Os pais da moça ajudavam emprestando um pouco de dinheiro para o casal, mas ela estava deprimida. Sentia falta do conforto, do luxo, enfim, da vida mansa que tivera antes de casar-se com João. O relacionamento entre os dois já não era que nem antes, e frequentemente, só tinham assunto em comum quando este era sobre Juca. João amava muito a esposa, mas no momento estava preocupado em arranjar um emprego, para poder oferecer um pouquinho de conforto para a esposa e o filho. Estava tão preocupado que nem tivera tempo para perceber o quanto Edwiges estava distante, triste e pensativa. Seus olhos já não brilhavam como antigamente. E assim foi a vida deste casal durante muito tempo.
Até que um dia, a moça já não suportando a vida dificílima de pobreza, junto com Juca - agora com cinco anos - fugira com um vizinho rico que se enamorara dela. Como João não conseguira um emprego fixo e tivera que sobreviver de "bicos", nem tivera tempo para reparar o flerte entre Edwiges e o belo, rico e atlético rapaz. O rapaz totalmente apaixonado pela moça, dissera que de agora em diante, ele seria o pai de Juca, até porque já se afeiçoara ao garoto. Quando João descobriu, já era tarde demais, e nem sequer poderia exigir a guarda do garoto porque não teria como pagar um advogado. Sua sorte é que a moça não lhe guardava mágoas e sabia que o filho jamais esqueceria o pai, mesmo amando a nova vida de riqueza e luxo que agora levava. Afinal, não simpatizava nem um pouco com o padrasto, apenas fingia, tendo em vista que adorava ganhar os vários presentes e brinquedos dados por ele. Mas faltava alguma coisa! E nem Juca sabia o porquê, mas sempre ao ver um carro, ou passar por uma oficina, ele se recordava de um careca que lhe cantava umas cantigas de ninar. A mãe dizia sempre que o filho estava confundindo sonho ou lembrança de algum programa infantil da TV com realidade. No entanto, Juca insistia, queria saber quem era o senhor careca de suas lembranças, Seria seu pai? Edwiges ficava ligeiramente chateada e dizia: “seu pai é meu amado marido o Edgar." Ao que o menino birrento respondia que não! Algo lhe dizia que seu pai era o senhor careca e de bigode de seus sonhos. O próprio Edgar já dissera várias vezes à esposa que não havia motivos para que Juca não conhecesse o verdadeiro pai; mas Edwiges tinha ojeriza até de lembrar o que ela considerava como o período obscuro de sua vida. Os avós de Juca também insistiam para que o menino conhecesse o pai, mesmo que fosse para depois nunca mais o ver.
De tanta insistência, Edwiges resolvera procurar João para combinar quando ele poderia ver e passar o resto do dia com Juca. Para sua surpresa, mesmo com um novo emprego, João estava na mesma condição de penúria de antes. E também com um semblante amargo no rosto que em tempos atrás era radiante de alegria, mesmo em situações difíceis. Edwiges dissera que não iria desculpar-se, apenas queria que o filho conhecesse o pai. Neste instante, João ficara com o semblante consideravelmente melhor, pois há tempos não via e nem tinha notícias de seu amado filho, e por razões financeiras não pudera contratar um detetive que encontrasse Juca. Edwiges nem parecia comover-se, é como se nunca tivesse tido algo com João. Friamente lhe disse que às cinco da tarde o buscaria para levá-lo ao encontro de Juca e retirou-se deixando uma quantia de quinhentos reais para que João comprasse uma roupa “decente” para poder encontrar o menino. João pôs-se a chorar e ainda que tentasse disfarçar, restava uma pontinha de amor por aquela moça, embora ela já não fosse a Edwiges por quem ele se apaixonou. Todavia, a imensa saudade que sentia de Juca falava mais alto, e pegando o dinheiro foi ao shopping mais próximo para comprar uma roupa nova. Ao chegar lá, entrou logo numa loja de marca, mas que era mais barata porque era uma loja de Fábrica. Já se imaginava com uma roupa bastante chique e abraçando saudosamente o seu filho Juca; quando de repente notara que os demais clientes da loja olhavam-o, recriminando- o. Dois homens, bastante altos e de ombros largos, o vigiavam bem de perto, preparados para lhe pegar e o retirar da loja, ao primeiro pedido do gerente ou de um casal de clientes, com aspecto de muita riqueza que reclamavam indignados de ter na mesma loja que eles, um “rélis” mecânico todo sujo de graxa. João sentindo-se humilhado resolvera sair antes que a situação piorasse. Do lado de fora, ligou – a cobrar - de um orelhão para o número de celular que Edwiges havia deixado junto à quantia de quinhentos reais. Triste, diria para a moça que teria que ver Juca outro dia, tendo em vista que não conseguira comprar a nova roupa. Contudo, do outro lado da linha ninguém atendia, a ligação caíra na secretária, onde a voz de Edwiges dizia: "No momento não posso atender. Tive que fazer uma viagem urgente à Paris, com meu filho e esposo para aliviar meu estresse. Qualquer coisa deixe um recado e telefone para contato”. Decepcionado, João voltou para oficina. Iria adiantar o serviço, assim, poderia esquecer que tão cedo não veria o filho Juca, se é que ao voltar de Paris o menino se lembraria dele. Aliás, João não fazia a menor idéia de onde ficava paris; e pensava: será que é no Oriente?