SONHOS E MEMÓRIAS

Hoje pouco me importa os sonhos. Cansei-me deles e dessa insistência em torná-los reais. Criei calos em meus pensamentos. Calos com farpas que machucam e uma voz silenciosa que grita saudades. Saudades de um tempo transformado em memórias. Memórias insones, eu diria. Mas isso também pouco me importa. Já me acostumei às agruras de lembrar e não poder reviver. Ou sonhar e não transformar em realidade. Hoje descobri que a realidade é como o suor do corpo. Transpira nos esforços e no verão e seca na ociosidade e no inverno. As memórias são como lágrimas. Nascem e umedecem a alma. Ou transbordam como rios.

Agora pouco me importa tudo isso. O nada é quase a marca real de meus dias, embora ainda me arraste por ele à procura de algo que nem sei bem o que. Algo invisível. Mas sinto os sonhos arderem minhas vontades, as lembranças queimarem meus pensamentos. Eles são minha marca apesar de tudo. Apesar da pele sem cor. Apesar do sol ter se apagado antes que a tarde chegue.

Na penumbra desses dias sem sol, cresceram as folhagens pálidas e úmidas. A estrada seguiu escura e no horizonte não avistei a linha dourada do amanhecer. Pouco me importa.Eu já não disse? Jamais fui amigável com a realidade. Sempre travamos uma batalha sem causa. E nunca compreendi seus abraços amargos. Mas sempre fechava os olhos e a aceitava. Estava no meu percurso e nunca entendi porque não a aceito. Talvez por causa dos calos dessas memórias tão latentes quanto ela. Talvez por causa dos sonhos que ela me rouba antes que se tornem reais. Mas eu mesmo sei que algo de mim ainda quer sonhar apesar de se apegar a memórias. Apesar de lutar contra a realidade. A razão de tudo isso eu não sei. Cansa-me tentar descobrir. Apenas sei que morrerei com eles: os sonhos e as memórias.

Sonia de Fátima Machado Silva
Enviado por Sonia de Fátima Machado Silva em 24/06/2006
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