A Síndrome de " O Tempo Levou" 

Uma das coisas que me mais me encantou quando assisti “E o Vento Levou”, foi Scarlett. A garota ousada e inquieta que destoava daquele tempo de anáguas sob os vestidões.
E que vestidos! Lembro de ficar perdida no meio da escolha dos mais belos no espetacular desfile que a moiçola exibia no filme. Aliás, lembrei disto outro dia quando uma amiga me contou estar passando pela Síndrome de O Tempo Levou.
- Como assim?- Perguntei, deduzindo que já haviam criado uma nova doença para marcar este século.
- É que descobri que sou infeliz no meio desta evolução toda. Desta era libertária, onde as mulheres andam cada vez mais conectadas e com menos roupas.

Sempre soube das crises existenciais de minha amiga e atravessei uma a uma de mãos dadas com ela, mas esta era nova para mim. Achei melhor seguir ouvindo.
- Raciocine comigo. Se eu vivesse no século passado não ficaria deprimida nunca! Todas as mulheres usavam vestidos enormes e rodados que escondiam tudo. Ninguém perdia tempo imaginando quantas celulites elas escondiam debaixo daquela panalhada. Estria?! Não devia nem existir no dicionário e, quem as possuísse deveria achar que eram as próprias linhas do destino tatuadas na pele. Porque, naquela época tudo era romântico!

Agora olhe para nós! As gatas high techs! Toda emancipação desejada, todo o respeito conquistado, toda a igualdade... Pra quê? Pra ficar gastando com analista!
Nada de vestidos longos pra nós, amiguinha! A moda dita mini. Mini saia, mini vestido, mini short... Manga longa? Tente encontrar nas lojas, não vai achar! É só alcinhas, braços de fora, costas de fora, gorduras de fora... E quem quer botar as pelancas de fora? NINGUÉM!
Antigamente moça era moça e velha era velha e, pronto! Mocinhas casavam cedo, tinham filhos cedo e ficavam velhas cedo. Nem imaginavam que pudessem tingir os cabelos. Também pra quê? Se todas morriam cedo!

- Credo! – Tive que falar - Você prefere morrer cedo?
- Agora não dá mais, né? Esta tal de longevidade cultivada pela geriatria está indo longe demais. A mulherada tá chegando aos CEM!
- Mas isto é ótimo! Quantas coisas nós ainda poderemos fazer, conhecer, descobrir...
- Seria ótimo, sim! Se fosse permitido envelhecer. Olha só o que está acontecendo. É a festa do estica e puxa!
Outro dia paguei o maior mico com uma colega que não via há tempos. Avistei-a de longe na fila do banco e ela sorriu e piscou para mim. Sorri e pisquei também. Ela sorriu e piscou; eu sorri e pisquei; ela sorriu e piscou... Aquilo foi ficando sem graça, resolvi cumprimentá-la de perto. Foi aí que percebi que ela estava com o rosto inchado e deformado. Então, a imbecil aqui teve a ignorância de perguntar: “O que houve com seu rosto? Foi acidente?” E ela respondeu: “Não, não, fiz plástica!” E a anta: “ Ah! Foi recente então, tá inchado ainda”. E ela: “NÃO! Faz mais de um ano!” TÓIM! Quem mandou abrir esta boca! Fui me despedindo e saindo de fininho então ela sorriu e piscou.

Tá vendo que coisa mais triste? As rugas se foram, mas agora ela pisca cada vez que sorri. E a boca?! Parece uma caricatura mal feita da Angelina Jolie. As bochechas! Lembra do Fofão da turma do Balão Mágico? Ficou o próprio! Agora responde: Existe prazer em envelhecer deste jeito, existe?
- É, deste jeito não. Mas, não precisamos nos render a esta nóia. Podemos fazer de outro jeito.
- Que jeito, amiga? Que jeito? Agora o mal já tá feito, nascemos no século errado! Deve ser carma!

Vai ver que fui Scarlett O'Hara em outra encarnação. Vai ver fui arrogante, fiz os homens de trouxas, pintei e bordei!Agora caí aqui para aprender.
A turma lá de cima deve estar pensando: “Tá vendo, deu uma de gostosona na outra vida agora vai ter que aprender a viver neste mundo onde não é permitido ficar velha.”
- Que exagero! Até parece que você é uma anciã!
- Exagero? Onde estão aqueles olhinhos sem papa? Onde está aquela boca sem bigode chinês? Onde estão aqueles lábios sem código de barras? O tempo levou, amiga! O tempo levou... Pior é que não deixou nem um Ashley Wilkes para me consolar.
- Toma aqui o meu ombro! -Amiga é pra estas coisas!

Léia Batista
Enviado por Léia Batista em 16/09/2009
Reeditado em 18/09/2009
Código do texto: T1813874