Nós falamos e escrevemos Brasileirês.

Escrever, na verdade, é muito fácil.

Escrever artisticamente, já são outros tantos e muitos.

Há quem pense que há só um tipo de escrita. Não os culpo -- isso foi ensinado na escola, pelos seus pais, pelos seus parentes e amigos, pela TV, pela literatura, pela lei e pela ordem, se viveram num meio que tinha acesso a isso. É a escrita segundo a norma culta. O que eu chamo de eruditês.

Só que, na verdade, poucas pessoas são capazes -- por treino, aprendizado e apreensão -- de usar esta escrita com propriedade.

A maioria, chuta. E chuta legal. Eu, inclusive. Adoro um coloquialês!

Mas na verdade, depois de ler sobre, num livro do curso de Letras de uma amiga (a Eujas, da outra crônica), e de viver mergulhada no universo dessa língua por quase uma década, aprendi o vernaculês autêntico. E comprovei, na prática, ouvindo os mais velhos falando, os que tiveram alguma educação em casa e na escola, dos mais humildes aos de mais posses, que há um vernaculês muito bem estruturado, correto dentro dos seus princípios, muito bem aplicado e articulado por essas pessoas.

E esse Vernaculês tem graduações que vão da sua forma correta até o uso mais destrambelhado, usado pelos analfabetos, em geral -- mas nem sempre --, e restrito à pequena região de origem ou de moradia do seu praticante. Praticamente um dialeto à parte. E ainda há aquele frankenstein linguístico, falado pelas pessoas que tentam falar eruditês ou coloquialês "de ouvido" e fazem uma salada tremenda.

Tive a feliz oportunidade de trabalhar numa pesquisa com alguns velhos contadores de causos de Pirenópolis, Goiás, como o Seu Ico e a Dona Benta, pessoas muito especiais. E foi uma experiência muito rica e fértil. Aprendi muitíssimo -- em vários campos, inclusive da linguística -- com e através dessas pessoas. E, claro, desenvolvi por elas um afeto profundo e respeitoso, além de uma admiração sincera...

Entre o Vernaculês e o Eruditês há também uma graduação, na qual, digamos, o coloquialês está um pouco mais próximo do vernaculês do que do eruditês...

E, a essa altura, a mocinha impaciente e o homem severo me perguntarão -- e o Brasileirês?

Ora, é tudo isso e mais um pouco.

Porque ainda há os regionalismos todos -- que são muitos e variados -- e as línguas indígenas, tão misturadas e incorporadas no nosso dia-a-dia, sempre segurando a peteca e comendo a pipoca. hehe

As palavras têm raízes. Tipo abraç. Daí vem abraço, abracinho, abração, abraçada, abraça, abracei...

Conhecendo as raízes e alguma coisa de fonemas, podemos escrever numa boa em eruditês, em coloquialês, em vernaculês, em goianês, em gauchês, em paulistês, em carioquês, em pernambuquês, em baianês e por aí vai.

Pode-se escrever a prosa muito bem estruturada e correta, de maneira a transmitir a mensagem pretendida, seja em eruditês, seja...

A gente pode escrever o texto muito bem construído e todo certo, pra dar o recado que a gente queria dar, seja em coloquialês, seja...

Nóis pode iscrivinhá a prosa muito bem arrumadinha e certinha, prumode dizê o recado que nóis quiria dá, seja em vernaculês, seja...

Viu como é fácil?

É só isso.

Depois é só pegar as boas idéias, vesti-las cuidadosamente com a língua escolhida e contar lindas histórias.

Maria Iaci
Enviado por Maria Iaci em 16/09/2009
Reeditado em 03/09/2010
Código do texto: T1812911
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