MASCATE

O Murilão, meu amigo, vizinho e parceiro de longos bate papos, me conta que em sua terra natal, Cordisburgo, nos seus tempos de moleque travesso, havia um mascate chamado “Candinho da Monark”, o qual enchia uma mala de bugigangas (lenços de seda para mulheres, pós de arroz, brincos, anéis, colônias, perfumes, sandálias, cintos de couro, espelhinhos, relógios) e saía a vender pelos arredores, visitando as fazendas da região no lombo da sua bicicleta “Monark”.

No princípio da carreira ele trabalhava cavalgando um burrico, mas logo que saiu a tal bicicleta, o Candinho se apaixonou pela “bike”, comprou uma e aposentou o burro, passando a visitar seus fregueses a bordo da sua máquina “papa-léguas”, como gostava de referir-se ao pequeno e utilíssimo veículo.

Um belo dia ele aportou na Fazenda do Riacho Doce, de um certo Coronel Boanerges, onde possuía freguesia entre o pessoal da casa, filhas e filhos do fazendeiro, e os agregados da propriedade, peões e boiadeiros.

Apeou da sua “Monark”, retirou sua mala do bagageiro e adentrou a sala da casa grande, recebido por Dona Risoleta e três de suas filhas, a Janaina, Jaciana e a Consolação. Foi introduzido na casa com alegria pelas mulheres, sedentas de novidades, e, após tomar um copaço d’água, e de falar um pouco sobre as notícias da vila, “Candinho da Monark” abriu seu baú de mascate e começou no seu mister de vendedor ambulante.

E assim foi pelo resto da tarde, atendendo a todos da família do fazendeiro e, após, os empregados, sendo que alguns trouxeram também suas mulheres e filhos pra adquirir produtos ofertados ou encomendar alguma coisa, um corte de chita, um vestido, uma bolsa, uma alpercata, um brinquedo de criança, um vidrinho de perfume que fosse.

Daí a pouco Dona Risoleta convidou o mascate para o café da tarde, já com a enorme mesa preparada na sala de jantar do casarão. O Coronel Boanerges foi junto, com as filhas, e se fartaram todos na broa de fubá especial, nos pãezinhos de queijo, no biscoito fofo, nos bolinhos de chuva, no queijo de coalho, no café com leite e nas deliciosas guloseimas preparadas com esmero por Dona Risoleta e suas serviçais.

Após o lanche vespertino, o Coronel Boanerges chamou o Candinho pra pitar um cigarrinho de palha na varanda, onde pretendia esticar o papo e ouvir as lorotas do mascate. Mas eis que o tempo escurece de repente, um raio risca os céus ao longe e ribomba um trovão anunciando chuva. Candinho ergue-se do banco e faz menção de ir embora, mas o fazendeiro ponderou:-

“- Eu acho melhor vosmecê pousar aqui hoje, Candinho. Essa chuva é forte e vai pegá-lo no caminho.”

“- Obrigado, Coronel, mas eu vou embora. Trepo nessa minha “Monark” e saio voando pra vila. É só subir o morro e de lá descer na banguela até o vilarejo. Chego lá antes da chuva, com certeza! ...”

Dito e feito, o Candinho afivelou sua mala no bagageiro da bicicleta, despediu-se de todos e pedalou rápido em direção à porteira. Passou, acenou de lá com seu chapéu e despinguelou pela estradinha de terra e cascalho de volta ao povoado. Daí a pouco desabou o temporal que se prenunciava.

Alguns dias depois o Coronel Boanerges foi à vila e deparou com o Candinho saindo de casa encarrapitado na sua “Monark”. O fazendeiro freou seu cavalo junto ao mascate e indagou sorrindo:-

“- Como é, Candinho? Vai me dizer que vosmecê não se molhou com o temporal daquela tarde? Deve ter se encharcado todo, não foi não? ...”

E o mascate devolveu ligeiro, serio que nem padre na extrema-unção:-

“- Que nada, Coronel Boanerges. Com a minha “Monark” eu sou rápido que nem foguete. Eu mesmo não levei nem um pingo:- a roda da frente da bicicleta levantava poeira e a de trás só jogava barro! ...”

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 14/09/2009
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