MEU UNIVERSO

Meu universo é muito particular. Acho que o de todo mundo é, não é? Mas devem existir universos-padrão, aqueles que são comuns a muita gente. Acho que o meu é incomum. Cheguei a esta conclusão depois de ter escrito uma crônica chamada “Vale uma crônica”, sobre o quanto eu fiquei impressionado com um cantor português chamado António Zambujo. Quantas pessoas aqui no Brasil, e especialmente aqui na minha cidade de Franca, berço esplêndido de tantos sucessos sertanejos, já ouviram falar de António Zambujo, jovem e inovador fadista? E como Zambujo, há uma galeria enorme de nomes que pouca gente ouviu falar e dos quais sou fã. Nomes que eu admiro, cantores que me emocionam. Recentemente, surpreendeu-me o fato de duas pessoas com com quem conversei, uma delas ligada à música, nunca terem ouvido falar de Charles Aznavour...E se eu falar de Mariza, Ute Lemper, Teresa Salgueiro, Mísia, Madeleine Peyroux, Chavela Vargas, Omara Portuondo, El Nene, Ibrahim Ferrer e outros, então? Lila Downs? E Ana Gabriel, Daniela Romo, Na Ozzetti, Elaine Paige, Jairo, Paloma San Basílio, Susana Rinaldi? Amália Rodrigues, alguns mais antigos a conhecem...

A particularidade do meu universo começou cedo. Na adolescência, ouvia Beatles e Bee Gees, mas era apaixonado mesmo pela Mireille Mathieu e Edith Piaf. Esta última ganhou, graças a Bibi Ferreira aqui no Brasil e ao filme “Piaf – um hino ao amor” de Olivier Dahan um pouco mais de popularidade.

Com o advento da Internet, fiquei surpreso ao encontrar minha tribo num site de relacionamento, o Orkut, onde há comunidades dedicadas a vários desses nomes citados acima. E surpresa maior foi encontrar nas comunidades de Edith Piaf uma grande quantidade de jovens entre 18 e 30 anos de ambos os sexos que amam, são apaixonados pela cantora francesa. O conhecimento deles sobre a cantora é fantástico, e eu, que me considerava um expert em Piaf, coloco-me humildemente em lugar de fã comum. Já tive contatos pessoais com alguns desses jovens, e há um que mora em Ribeirão Preto que agora sempre vem a Franca para assistir aos meus shows, veio ao sarau que promovi, “desde que eu cantasse algo da Edith”.

No meu consultório, pela característica especial das consultas homeopáticas, que esmiúçam as pessoas em seu interior, tenho encontrado muita gente interessante, com grande variedade de particularidades, talentos jamais suspeitados, conhecimentos inimagináveis sobre os mais diversos assuntos.

E assim, à medida que o tempo passa, não mais me incomoda o fato de não gostar de futebol, de ter lá minhas restrições contra Roberto Carlos (mas assisitir a todos os seus shows), de gostar de filmes nacionais, de gostar de idiomas, de colecionar programas de teatro (tenho uma fantástica coleção de todos os espetáculos de assisti desde 1969!), de gostar de ouvir fados, de ter um universo particular tão particular! São as vantagens da experiência de vida... Fatos que antes poderiam envergonhar-me hoje me diferenciam, sem correr o risco de ser considerado excêntrico... E é bom saber que existem tribos que compartilham meus gostos, e aqui mesmo no meu prédio eu posso pegar o telefone e dizer à minha amiga Goret:

“Suba pra gente tomar um vinho e ouvir um CD do Zambujo!”