Plateia

Resta apenas uma imensa fraqueza. De tudo que um dia foi, de tudo que um dia sonhou, agora resta apenas a fraqueza e um triste e desesperado desanimo. Talvez no fundo, bem lá no fundo ainda haja resquícios da doce e sonhadora menina que foi um dia. Mas isso é passado, e ela já não busca recuperar o que perdeu. Agora ela só deseja ter forças para cair. Forças para se perder e não mais voltar. Seu único desejo agora é fechar os olhos e nunca mais ter que abrir. Nunca mais levantar. Nunca mais ver a luz. Nunca mais ter que tentar.

Às vezes quando anoitece e na cama ela tenta conciliar o sono, pensa que pode finalmente ter chegado a sua vez, que se ela fechar os olhos com muita força, mais muita força mesmo, eles poderão nunca mais abrir. E então, esperançosa, busca em sua mente as suas melhores lembranças, numa tentativa desesperada de partir feliz. Como se aquelas que foram os paliativos de sua vida, pudessem também tornar menos frustrante o fim de uma existência inútil. Mas o fim não chega, apenas a noite vai embora dando lugar a um novo dia. O milagre do fim não acontece e é preciso continuar.

O celular toca e seus olhos ainda podem abrir-se e chocar-se com a luz que entra pela fresta da janela. Ainda respira e é preciso estar pronta para seguir.

Mas a verdade é que não é fácil, não é fácil continuar quando nada em você responde como deveria, quando as pernas travam e recusam-se a andar, quando os olhos apenas lhe oferece uma visão turva e fria, quando não há mais paladar. O tato não é mais capaz de sentir, quando até mesmo o olfato não está diferente. E o cheiro de café fresquinho já não ajuda a despertar. Mas ainda assim, com toda a dificuldade de quem apenas sobrevive ela sabe que tem que continuar, sabe que é preciso levantar e fazer tudo o que esperam.

Sabe também que poderia ser fácil e simples, mas não consegue. Afinal sempre foi platéia incapaz de escrever um capítulo de sua patética vida.