DE VOLTA AO FAROL AMARELO


13 DE FEVEREIRO/2005
Já se foram mais de 35 anos dêsde o dia em que deixei você.Agora,o retorno...E tal como a canção:"Eu parei em frente ao portão"...A busca por um histórico escolar trouxe-me de volta pro teu aconchego.
A presença silenciosa da saudade me fez companhia e juntos subimos lentamente as tuas escadas."Tudo estava igual como era antes,quase nada se modificou,acho que só eu mesmo mudei,e voltei."
As camélias que te circundam conservam ainda o mesmo vigor e o mesmo brilho em suas folhas.Mas...Não cresceram tanto.
A fileira de janelas espia agora uma cidade que embora tenha crescido,reserva-se à rebeldia de preservar em meio ao progresso;alguns pequenos detalhes de outros tempos.
As pedras da 24 de maio,com brilho polido de pneus,vão abrindo caminho entre os antigos sobrados proximos de teu portão.Aquêles mesmos sobrados,fieis depositários das esperanças,dos sonhos e euforias nos finais de turnos.Dos risos,flêrtes e até do engomado solene das roupas e o repicar da fanfarra rumo à avenida principal nas paradas da semana da Pátria.Alguma coisa me faz sentir que estas lembranças permanecem bem guardadas naquelas varandas serenas,no silêncio acortinado daquelas janelas.
"Fui abrindo a porta devagar,mas deixei a luz entrar primeiro"...Tuas paredes estão ungidas de gratas recordações.Não lembro de ter ouvido o teu carrilhão?!...Ah! o carrilhão...A sonoridade cronometrando o compasso nervoso da espera dos resultados.As provas finais:"Aprovado",ou não;a angustia provocando suores nas mãos.E assim,como quem retorna à casa onde cresceu,vou ganhando o seu interior.
Da escadaria que levava à sineta (será que ela ainda existe?)filtrada pelo vitral uma tênue claridade derrama-se pelos degraus que descem do segundo ao primeiro piso.Por um instante mentalizo a fisionomia de antigos mestres (hoje em outras dimensões)vindo ao meu encontro.Se a vida realmente acompanhasse a canção eu diria."Eu voltei,agora pra ficar,porque aqui...Aqui é o meu lugar,eu voltei pras coisas que eu deixei,eu voltei!"...Mas não é assim.Um arrepio,um travo na garganta...Fujo da imagem e busco no corredor escuro,nas portas altas que entreolham-se,a que fôra da última sala que frequentei.
A cabeça rodopia e então a noite cai sobre a Irati dos anos 70.É morna,e como bem lembra um grande escritor Iratiense,"Guarda o cheiro dos jasmins da 24 de maio".Um trem apita e nas barraquinhas da Matriz de Nossa Senhora da Luz,um disco de vinil do Roberto ,fala de amor,rasga o silêncio da cidade,transborda em paixão aquelas salas imensas e rouba a cena na aula do professor Ernani.
Na torre da igreja,"A palavra Adeus"...Canta o rei:"Vi a luz do entardecer aos poucos se apagar pra mim,não...Não sabia se você ainda estava junto a mim"...Isso,num tempo em que "enamorava-se" primeiramente,"ficava-se" depois,punha a sala inteira em divagações,em sonhos com as "festinhas" de final de semana,entradas e saídas de cinema,encontros enluarados,enfim,qualquer coisa que não a geometria do entusiasmado professor.
A lembrança se desfaz,é hora de voltar à rotina,de continuar a luta.Conforta-me a certeza em saber que parte de minha singela história continua arquivada e,  ternamente preservada entre as paredes dêste "farol amarelo",que sempre indicou direções,norteou caminhos e soube reter um pedaçinho de cada um de seus filhos "pródigos" que acabam sendo recebidos de braços abertos no retorno a esta segunda casa paterna.



Dedico esta crônica a todos os alunos do Colégio São Vicente de Paulo (Irati-PR),em especial à turma do Colegial e do terceiro ano de Contabilidade no ano de l970.