E a vida segue...

Tarde de quarta-feira. Dia ensolarado.15 horas. Avenida Raja Gabaglia. Um homem corre. Atrás, vários policiais. O medo toma conta de quem está na rua. As pessoas vão para suas casas. As crianças, que antes brincavam na rua, não sabem o que fazer. Começa a gritaria. Portas e janelas são fechadas. Todo mundo tenta se esconder. Eu observo tudo de dentro do prédio onde trabalho, próximo a favela onde ocorreu o incidente.

Nos edifícios próximos ninguém sabe o que está acontecendo. Uns tomam café, outros conversam tranqüilamente, outros ainda estão concentrados em seus trabalhos ou em reuniões.

De repente, um estrondo. Alguns acham que são fogos, outros dizem é tiro. Um, dois, três, quatro, cinco...ninguém sabe ao certo. Eu também, da mesma forma que alguns descrentes de que fossem tiros, acreditei nos foguetes! Pura inocência!

O pânico toma conta de quem está próximo ao local, principalmente dos moradores. Inclusive eu e meus companheiros de trabalho. Não é todo dia que se vê um tiroteio tão perto assim.

Um corpo cai ao chão. Os policiais chegam. Pegam o corpo e o colocam na viatura. Dizem que vão levá-lo ao pronto-socorro. Quem viu pensa: Levar pra que? Se o homem já morreu. Confesso que pensei a mesma coisa, pra que levar para o hospital se ele já estava morto, mas como ninguém quer aparecer na mídia acusado de matar alguém, eles fazem esse lero-lero de fingir que socorreram.

As janelas e portas começam a se abrir. O movimento começa a tomar conta da rua. Junta gente pra ver. No chão, sangue, sangue e mais sangue. Começam os comentários. Merecia morrer. A polícia veio se vingar. O policial fazia parte do tráfico, foi morto por acerto de contas. Foi um assalto, os bandidos não sabiam que era um policial.

Uma senhora lava a calçada que há pouco estava coberta de sangue. Está indiferente a tudo que se passou. De cima dos prédios as pessoas observam a cena, mas sem se intrometer.

Os repórteres chegam. Estão aflitos por notícias. Precisam obter informações. É um furo! Ninguém sabe de nada. Ninguém viu, nem ouviu. É proibido falar. Se descobrirem quem contou já se sabe: vai virar presunto. As crianças e os jovens começam a recolher as balas do chão. São várias. Enchem a mão.

As pessoas vão voltando para seus trabalhos, as crianças para suas brincadeiras. É a vida que segue novamente.