MULHERES QUE APANHAM

Era um sábado ensolarado quando eu cruzei com um antigo amigo que já tentara me matar. Seu nome era André e a nossa amizade seguia firme e forte até que surgiu Mariana... sim, essa é uma crônica sobre um triângulo amoroso com doses de tragédia grega.

Mariana era a mulher que eu amava; a mulher que eu queria do lado; mas foi o destino que quis que ela só fosse feliz nos braços de outra pessoa; essa pessoa era o meu amigo André, sujeito que em pouco tempo eu tinha aprendido a gostar, a respeitar e a quem eu só queria o melhor, até desejar o pior: que ele não tivesse a mulher que eu queria comigo.

Ela era a minha amiga, ele meu grande chapa; O que fazer e dizer?

Não havia nada a não ser sair da frente; do caminho e foi o que fiz. Lembro ainda da noite em que André me ligou dizendo que só ficaria com Mariana se estivesse tudo bem comigo; não estava! Mas se a felicidade deles dependesse da minha dor de cotovelo, que caísse meu braço esquerdo e depois o direito, pois não há nada que se possa fazer quando a mulher dos seus sonhos quer outro e não você.

Eles ficaram juntos e se enamoraram. André continuou meu amigo; Mariana também, pois continuou a frequentar a minha casa como amiga; sem André saber, pois junto com o amor de André, ela conquistou também o ciúme dele por tudo e de todos, até do amigo que ele sabia que não poderia nada fazer além de ser um amigo dela.

O ciúme saltou das brigas verbais para a agressão física; certo dia, Mariana veio me visitar e mostrou as marcas no pescoço de uma briga com o seu amor. O que fazer e dizer?

Mamãe me ensinou que em mulher não se bate nem com uma pétala de flor.

Não sei se você sabe, amigo leitor, mas segundo as pesquisas dos Órgãos de Defesa da Mulher; por ano, mais de 2 milhões de mulheres sofrem espancamentos graves no Brasil. Fazendo uma conta meio tonta, isso representa: 175 mil mulheres agredidas por mês; 5.800 por dia; 240 por hora; 4 por minuto; ou seja, a cada 15 segundos, uma mulher é espancada no país.

Mariana era uma mulher inteligente, mas agia inocentemente quando o assunto era o seu companheiro: “vou mudá-lo” dizia ela, convicta que poderia encantar a violência com a magia do seu coração.

Enquanto conversávamos, o interfone tocou; era André; e como em uma cena clichê dessas novelas mexicanas-brasileiras de amor e traição; ela saiu, bem à tempo, dele entrar em cena; invadindo a minha casa, olhos de Hulk banhados em fúria, ciúme, raiva e com punhos prontos para o ataque.

- Onde está Mariana? – ele perguntou, procurando a imagem da sua amada nos cômodos da minha casa, sem saber que ela só estava agora na minha alma.

- Ela não está aqui! – respondi o óbvio, querendo que não fosse verdade; desejando secretamente que ele tivesse nos flagrado em uma cena ardente e eu assim, apanharia feliz, pois apesar de não ser gente de briga, luto pessoalmente por amor.

André era um Golias e eu não tinha o menor perfil de Davi, daí a vitória já era dele; mas confesso: eu tinha o desejo secreto que ele estivesse certo, que ela estivesse traindo a violência dele com o meu carinho, mas ela me rejeitara; talvez porque eu era amigo demais para que o seu corpo explodisse em erupções de reações químicas amorosas; talvez porque eu fosse para ela apenas um par de ombros e orelhas amigas.

Diante daquele homem prestes a cometer um Franquicídio, me perguntei: por que razão ele batia em Mariana? Por que a agredia?

Na estante, os livros de psicologia diziam: desvio psicológico, baixo estima, impunidade, sentimento de dominação, imaturidade, etc. Muitas eram as razões, explicações, mas nada justificava agredir uma mulher. Contudo, estava claro para mim, que se existia um motivo para eu estar vivenciando aquilo, era para que eu lembrasse da importância de tratar a todos com respeito e solidariedade; principalmente as mulheres, as crianças e os mais velhos.

Para André, contudo, só havia o impulso, as emoções mais primatas tomando conta de seus movimentos, dirigindo os seus pensamentos. Naquele ser ciumento e colérico não havia o menor sinal da presença do meu amigo.

- Vou te dizer uma coisa – disse ele, segurando o meu braço – Se eu souber que ela voltou aqui ou que você se aproximou dela; pode acreditar: eu a mato! - e soltou o meu braço, mas continuou - Se eu souber que você ligou para ela, eu vou arrebentar tanto a sua amiga que você vai perceber que estou falando sério. Se quer o bem dela, se afaste e a esqueça– disse, concluindo a sua ameaça, e depois partiu, batendo a porta.

Respirei fundo, orei aos Deuses que protegesse Mariana.

Diante das ameaças, não tive dúvida, obedeci! Tinha receio que algo ocorresse com ela; daí, ignorei os seus telefonemas; fiz de conta que eu não era mais o seu amigo; e o tempo nos afastou e foi apagando os rastros dos meus sentimentos; e algumas voltas da vida depois; eu já estava em outro estágio; com alguém do meu lado que jamais aceitaria qualquer movimento dos meus braços que não significasse carinho.

Onze anos depois, num sábado ensolarado, eu esbarrei com André. Meus olhos tentaram fugir, quis trocar de rua, evitar o encontro; mas para a minha surpresa, ele veio em minha direção. André tinha a cara do meu antigo amigo e não daquele ser ensandecido que deixara aquela última imagem na minha memória.

- Frank!!! – disse ele sorrindo – Há quanto tempo!

Elegância. Essa é a palavra para descrever como ele me tratou e como conversei com ele. Sim, ele ainda estava com Mariana e eles tinham três filhos.

- Vou encontrar-me com Mariana! Quer vir junto? Ela vai adorar te rever, depois de tanto tempo!

Agradeci o convite, disse que tinha compromisso, claro, menti! Não que eu ainda tivesse algum sentimento por ela ou mágoa por ele; bem longe disso; mais achei que não convinha; foi melhor me despedir, prometendo manter contato; mas fiquei contente em saber que Mariana estava bem e era mãe de três crianças; quem sabe ela não conseguiu mudá-lo; quem sabe ele não procurou ajuda e se tornou um novo homem. Gosto de pensar nessas possibilidades, afinal nessas histórias de ciúme e violência, quase sempre o final é infeliz.