Era uma vez...
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...Um homem que vivia tendo ideias.
Ele era um homem incomum, pelo menos se julgava assim. Vivia opinando em tudo.
Certo dia alguém deu a ele um poder imenso. Ele pegou seus amigos e os reuniu todos, dando a cada um deles uma fração do poder.
Ao amigo de luta deu o cargo de senhor das armas.
O povo não se importou com a nomeação e a soberania do país ficou abalada – mesmo sem que o povo se apercebesse dessa fraqueza.
A um segundo amigo, deu o cargo de senhor da saúde.
O povo não se importou e o país ficou doente – mesmo enfermidades mais simples acometeram a todos.
A um terceiro amigo ele deu o cargo de senhor dos esportes.
O povo não se importou e, doente, não mais praticou esportes – mesmo assim, o senhor dos esportes permaneceu no cargo.
A um quarto amigo ele deu o poder religioso.
O povo não se importou e no país nunca se viram tantas seitas e religiões surgir por toda parte da nação – mesmo assim, o país, agora essencialmente laico, submeteu-se ao amigo do homem que tinha muitas ideias.
Os homens das armas não se revoltaram contra o senhor das armas, amigo do homem que tinha ideias.
Os homens da saúde não se revoltaram contra o senhor da saúde, amigo do homem que tinha ideias.
Os homens dos esportes não se revoltaram contra o senhor dos esportes, amigo do homem que tinha ideias.
Os homens de fé não se revoltaram contra o senhor das religiões, amigo do homem que tinha ideias.
Um dia, o homem que tinha muitas ideias teve outra ideia e permutou os amigos no poder, sem consultar o povo.
O senhor das armas virou senhor das religiões. O senhor dos esportes virou senhor das armas. O senhor da saúde virou senhor dos esportes e o senhor das religiões virou senhor da saúde.
E o povo não se importou – mesmo sabendo que todos os senhores amigos do homem que tinha ideias não sabiam nada sobre armas, saúde, esportes e religião.
E o homem que tinha ideias continuou tendo ideias.
Certo dia, enquanto sonhava, ele teve outra ideia. Acordou e resolveu executar o que havia pensado no sonho.
Chamou um homem das armas para cuidar das armas. Chamou um homem de religião para cuidar das religiões. Chamou um homem da saúde para cuidar da saúde e, finalmente, um homem dos esportes para cuidar dos esportes.
E o povo não se importou – mesmo sabendo, tempos depois, que as ideias do homem que tinha ideias não foram executadas porque os amigos do homem que tinha ideias o executaram antes que as ideias fossem colocadas em prática.
Hoje, aquele povo, antes forte e soberano, existe apenas nos contos de fada que se iniciam com ‘era uma vez...’.
Crato-CE, 6 de setembro de 2009.
22h14min