Oca

- Meu Deus! e agora!?

Pronto. A certeza do fim. Três cigarros seguidos e uma evocação aos céus são sinais claros e definitivos de desespero. Do meu desespero!

Ah, como posso me perder por tão pouco? Já havia acabado mesmo. Duas vidas estranhas dividindo uma casa vazia e impessoal. Vazia e impessoal. A casa, a relação, as pessoas...

Acabado? Como posso falar do fim de algo que se quer começou? Nunca houve a verdadeira entrega. Faltava o sentimento. Havia a paixão, mas ela nunca é o bastante. Ainda que forte e incendiaria como a nossa.

Tudo muito rápido; em um dia o encontro perfeito: planos, idéias, desejos; logo a mesma casa e o mesmo espaço. Não fui para sua nem ele quis vir para minha. Quebramos contratos de locação e vendemos os móveis numa atitude inconseqüente e infantil. Ciúmes do passado.

A mudança que deveria nos tornar próximos, nos fez mais distantes. De repente tudo era rotina e automação: café, trabalho, cama e cinema (nos finais de semana). O amor virou rotina e costume. Rotinas assimiladas, e planos adiados e esquecidos. Não, não havia o esquecimento, a lembrança era viva, mas havia a acomodação, e o mundo dos acomodados é inegavelmente mais fácil.

A conversa entre pessoas, sempre, muito ocupadas e voltadas ao seu mundo, torna-se artigo raro que, nem sempre, é bem aproveitado.

Novo contrato rompido. Foi embora. Silenciosamente arrumou suas coisas na mala; silenciosamente o vi sair. Poderia ficar, tranqüilamente, aqui. Mas como conviver com a oca de nossa relação? Nada é tão impessoal a ponto de não deixar marcas em quem viveu.

Dominique Gasparin
Enviado por Dominique Gasparin em 07/09/2009
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