Jejuando
Aos poucos vou me familiarizando com a falta de sono e comida. Sono, nem tanto.
Aos poucos parece que o barulho ao longe, se torna insignificante. Mesmo quando não há respeito, mesmo assim, você pode ignorar o ambiente, as pessoas, e a falta de educação. Enquanto discutem relacionamentos, na sala de estudos.
A chuva lá fora, que teima em começar e não se fixar, aos poucos, ela se torna parte de você. Do que você vê e do que você é. Na verdade, tem mais haver com o que você ouve.
Aos poucos, não faz diferença escrever.
Lá fora, do outro lado da janela, na rua molhada, os passos apressados, os freios um pouco à tempo, aos poucos, ela tem história para contar.
Aqui dentro, não muito frio e às vezes não muito quente. No feriado, sem muito movimento.
Tem esse policial estranho, que está sempre por aqui agora. Para vigiar o baleado.
Baleado, cuidado, vigiado, decorando o novo ambiente.
No leito, do lago, os peixinhos morrendo de fome. Não morrendo, mas jejuando.
A barriga, volta a roncar então. E não há comida. Não que seja falta de dinheiro, nem falta de tempo, nem falta de sono. É só falta de educação.
De respeito.
Sou a favor das regras e do bom senso. Para salvar vidas. Não para humilhar.
Continuo lendo, esqueci meu ticket. Esqueci meu prato.
E a meu lado, tem uma parede inerte, que não sofre por mim. À minhas costas, a chuva lá fora, e a pista molhada contando suas histórias.
Aqui, na minha frente, um grupo de mulheres gulosas, sobre realidades, encontros e desencontros, sobre cinema e festas e muito comida à mostra.
Não me oferecem, nem mesmo, o farelo do pão.