Alguém Como Nós
Eu me considero um grande observador de tudo ao meu redor. Gosto muito de participar, conversar, ajudar e, principalmente ouvir. Pois todos nós temos algo a aprender com o nosso semelhante.
Certa vez viajava de trem para São Paulo e tomei o trem que partia às 6:30 h da manhã, de Campinas. Fui me sentar junto a um senhor, que parecia estar só, no meio de muita gente.
Depois de cumprimentá-lo, com o trem já em movimento, ele me disse:
- Foi bom você vir se sentar aqui, pois não consigo ficar calado por muito tempo.
E continuou:
- Eu me chamo Rodolfo e moro na Região da Alta Paulista. Estou indo a São Paulo para visitar irmãos que moram na capital e não estão com a vida muito bem arrumada. Vou ver se posso fazer alguma coisa para ajuda-los.
Então eu lhe disse:
- Eu me chamo Laércio e sou maquinista da Cia Mogiana. Também estou indo a São Paulo para uma visita à Igreja se Santa Izabel, minha orientadora em todos os momentos difíceis da vida. Acho que a missão do senhor é muito importante: levar um apoio aos seus irmãos.
Ai ele me disse:
- Sou católico, mas não vou muito à igreja. Porém, não posso ver ninguém sofrendo que tenho vontade de ajudar, e olha que quanto mais eu ajudo mais me sobra para ajudar. Se o senhor não se aborrecer, eu gostaria de contar a história da minha vida. Sou o filho mais velho de quatro irmãos. Meu pai era uma mistura de espanhol com alemão. Homem de gênio forte e autoritário que não gostava de ser desobedecido. Meus pais já haviam escolhido uma nora que seria a minha esposa, só que não sabiam que eu tinha outros planos para a minha vida. A nora que eles haviam escolhido para mim era de uma família de portugueses, assim como a da minha mãe. E a moça de quem eu estava gostando era a Hilda, filha de uma família de baianos. Quando meu pai soube, ele me disse: “Se você não respeitar a minha vontade pode pegar o que é seu e ir embora”.
- Assim, com 21 anos eu sai de casa, com uma mala muito fraquinha e algumas roupas e algum dinheiro guardado. Resolvi tentar a vida em São Paulo. A minha namorada Hilda prometeu me esperar. Ela tinha só 18 anos, na época.
- Com os meus parcos recursos, eu fui morar numa pensão no Brás. E como eu sabia trabalhar de eletricista de carros e também era mecânico, não foi difícil arrumar um trabalho nesse ramo. Depois de alguns meses, um colega de serviço me propôs sociedade numa oficina, na casa dele. Aceitei. E depois de muito trabalho nossa empresa começou a dar lucro. Nessa altura eu já tinha me casado com a Hilda. E para ficar mais perto, mudei para Jundiaí. Depois de três anos eu vendi a minha parte na sociedade para o Amâncio, que era o meu sócio e ele, antes de aceitar a oferta me disse: “Você vai fazer muita falta aqui, não pelas suas habilidades no trabalho, mas como um ser humano”. Ele arrematou: “Se um dia você quiser voltar, as portas estarão sempre abertas”.
- Voltei para a minha terra onde montei uma oficina de carros e caminhões e onde estou muito feliz. Hilda e eu temos dois filhos. Há pouco tempo soube que, através de negócios mal feitos, os meus pais estavam perdendo a casa onde moram. Por intermédio de um parente, de maneira sigilosa uma vez que se meu pai viesse a saber que eu o estava ajudando não aceitaria, eu cobri a importância que o meu pai precisava.
Ai eu fiz ver a ele que a sua atitude foi de uma nobreza maravilhosa, tanto para com seus irmãos como para com seu pai, mesmo este não o apoiando e o tendo tocado de casa.
Eu lhe disse:
- Pode ter certeza. Toda ajuda que você fizer terá sempre alguém, num plano muito elevado, que o estará aplaudindo.
Nesta altura o trem estava entrando na Estação da Luz.
Ao descermos ele me abraçou e me disse:
- Obrigado por ter me ouvido, e que Deus o ampare sempre.
Ao me afastar, fiquei pensando: Ali vai um ser humano de alma pura. Mais um que entendeu que estamos aqui de passagem. Que a nossa missão é progredir, material e espiritualmente, sempre estendendo a mão aos mais necessitados. Alguém como nós.